Em abril, elaboramos um leanmail - "As dificuldades do sistema puxado" - focalizado nas dificuldades de implementação e manutenção do sistema puxado na produção, com base nas experiências em dezenas de empresas dos gerentes de projeto e instrutores do LIB.
Naquela ocasião, solicitamos o feedback da comunidade lean para compartilhar conosco as suas dificuldades específicas. Recebemos muitas respostas e comentários dos quais vamos citar alguns, ainda que de forma reduzida, e sem identificar os nomes.
Problemas de estabilidade básica (fornecedores e materiais).
| "Existe uma dificuldade muito grande de se ter o material do fornecedor no momento necessário, ou seja, a falta de vários materiais impossibilita seguir a sequência normal de montagem, obrigando-nos a tomar ações paliativas para continuar a produção até o momento em que a peça faltante chega". |
| Agente de Mudança Lean |
| "A quantidade de fornecedores internos e externos é muito variada. Em caso de falhas ou danos, às vezes é necessário contato com o fornecedor para poder fazer inversão do item com relação ao que está na produção. O controle dos materiais é muito complexo. Os "lead times" de peças com problemas podem chegar a meses quando importadas. E não há uma força tarefa urgente para garantir que o item chegue o mais rápido possível". |
| Gerente de PCP |
Dificuldades com a liderança e com as pessoas.
| "Em algumas oportunidades de implantação do sistema puxado, vivenciei como experiências negativas principalmente a troca constante do pessoal operacional e também do pessoal de gestão (no caso mais comum, supervisores) que estavam à frente do negócio. Dessa maneira, toda a cultura, treinamentos, rigor e disciplina que o sistema exige iam embora. Como o dia-a-dia exige todo o tempo, não se costuma dar manutenção ao sistema, ou seja, os novos membros chegavam e tinham que aprender à "fórceps" e nem sempre da maneira correta. Dessa forma, perdia-se o treinamento, começavam a perder a essência e o sistema morria, as pessoas paravam de seguir por não entender". |
| Diretor de Manufatura |
| "A supervisão nem sempre está preparada para sustentar um sistema puxado, pois ela não tem o controle do processo das suas áreas, não faz acompanhamento efetivo do andamento da produção, mesmo quando tem um QAP, e delega essa responsabilidade a um monitor da área. Não há uma definição clara do trabalho para supervisão em termos de papéis e responsabilidades. E mesmo quando há, não são seguidos". |
| Gerente de PPCP |
| "A falta de autonomia dos agentes de transformação (geralmente alocados no nível tático, mas ligados a operações) frente à guerra de interesses políticos e indicadores mal distribuídos e conflitantes causam atraso na implantação dos sistemas puxados, podendo até cair em descrédito versus o modelo tradicional. O agente de transformação deve ter poder para transformação, deve ser um diretor ou até o próprio presidente da empresa que compre a ideia e lute para implantá-la. Daí, as iniciativas terão um caminho "top-down". Caso se mantenha em níveis táticos ou operacionais, as melhorias serão isoladas e concentradas em algumas operações locais, não haverá, ou haverá pouco impacto no restante da cadeia". |
Dificuldades de entendimento em ambientes de produção sob encomenda.
| "Na minha empresa, cada produto é fabricado a partir da demanda de cada cliente, sendo estabelecido um calendário a partir de datas de entregas determinadas pelos contratos. A possibilidade de se criar um supermercado ou um pulmão para garantir os prazos de entrega aos clientes é impossível". |
| Coordenador Lean |
Dificuldades com a atuação e a postura do PPCP.
| "O PPCP precisa ter uma visão mais clara e abrangente de todo o fluxo de valor e recuperar sua real capacidade de planejar. Lógico que às vezes um replanejamento é necessário para não atrasar a produção". |
| Supervisor de PPCP |
Falta de atitude gemba.
| "A maioria das empresas estabelecem um modelo de governança e tomada de decisão por matrizes numéricas, que poderão ser elaboradas muitas vezes com dados amaciados, que as direcionarão a decisões erradas. Isso poderia ser facilmente resolvido através do "gemba", o famoso "vá ver o que está acontecendo". Levantar da cadeira com certa frequência e ver o que realmente está acontecendo dentro da sua fábrica. Quanto mais ficar no seu escritório, e menos vezes visitar em loco o processo de interesse (processo chave), mais distorcida será a fotografia que terá da sua empresa. Portanto é hora de andar um pouco mais, mesmo que tenha gerentes, coordenadores, supervisores e encarregados de sua mais alta confiança, vá ver com seus próprios olhos, vá conversar com as pessoas, vá se mostrar e se fazer conhecido a quem faz as atividades". |
| Coordenador de Melhoria Contínua |
Sistemas puxados são abandonados quando as condições mudam.
| "Logo nos primeiros passos de nossa jornada Lean, o sistema puxado era muito debatido e requerido. Tivemos ótimos resultados. Mas com o aumento da produção e a entrada de novos modelos, hoje praticamente não é nem falado [sobre o sistema puxado]. O que acontece agora é um constante ajuste no dia-a-dia." |
| Coordenador de Escritório de Promoção do Lean |
Mas são trazidos de volta, pois sem eles os resultados pioraram.
| "Há alguns anos, tivemos um sistema puxado, mas que aos poucos foi abandonado. Eu não trabalhava aqui ainda. Os resultados foram piorando (estoques aumentando e entregas piorando) tanto que estamos reimplantando o sistema agora". |
| Gerente de Produção |
E ainda, alguns itens podem ser adicionados à nossa lista inicial de dificuldades mencionadas no leanmail de abril;
- Falta da consciência/disciplina em manter o 5S nos supermercados;
- Falta de auditoria do sistema puxado;
- Layouts existentes não contribuem para uma correta instalação dos supermercados, causando transportes longos e desnecessários, às vezes fora do fluxo;
- Falta de uma logística de movimentação detalhada e metódica do kanban, embalagens e insumos.
Há ainda temas polêmicos como a convivência do SAP/MRP com o sistema puxado. Alguns defendem a maior facilidade de tornarem o kanban em eletrônico enquanto outros defendem que umas das vantagens do kanban tradicional é o fato dele ser visual e, portanto, mais apropriado para mantê-lo sob o domínio das pessoas envolvidas, ainda mais no Brasil onde a formação das pessoas ainda é deficiente e a operação dos sistemas de informática nem sempre é estável.
Várias pessoas aproveitaram a oportunidade e enviaram questões adicionais sobre temas correlatos, como a relação entre o sistema lean e o processo de S&OP (Sales and Operations Planning) ou ainda o que está acontecendo com as empresas que estão conectando o Lean e o Seis Sigma, havendo preocupações com o uso desses conceitos para simplesmente "cortar pessoal".
Essas indagações, assim como outras, versando sobre os mais diferentes temas, chegam até nós com alguma frequência. Sem poder dedicar o tempo necessário para respostas mais claras e precisas, imaginamos que talvez fosse o momento de criarmos oportunidades para que a comunidade lean conversasse entre si sobre esses temas.
Nesse sentido, estamos pensando em abrir um canal eletrônico permanente de troca de ideias, informações e experiências entre os membros da comunidade lean. Aguarde mais informações sobre este Fórum de Discussões brevemente.
PS1. O artigo "Como enfrentar as dificuldades do sistema puxado" de Lando Nishida fala sobre as dificuldades adicionais do sistema puxado.
PS2. Algumas experiências com o sistema puxado e outros elementos do sistema lean serão apresentados no Fórum Lean Rio a ser realizado no dia 19 de agosto. Estarão apresentando as seguintes empresas: MAN-VW Caminhões, GE Celma, PSA (Peugeot-Citroën), GSK (GlaxoSmithKline), Michelin, BBraun, Alcoa, Fresenius, Guerbet e Benteler.
PS3. O artigo de Michael Ballé, coautor de "O Gerente Lean", aborda o tema da cultura na transformação lean. Esse assunto é o foco do workshop "Liderança e Cultura Lean" no dia 15 de julho na VW, em Taubaté-SP.