ESTRATÉGIA E GESTÃO

Lean Summit 2025: 30 anos aprendendo e avançando juntos

Flávio Battaglia
Lean Summit 2025: 30 anos aprendendo e avançando juntos

O Lean Summit 2025 reuniu, no Distrito Anhembi em São Paulo, cerca de 2.000 profissionais de mais de 500 organizações para refletir sobre quase três décadas de prática do sistema lean no Brasil. Ao longo de dois dias, 120 executivos de mais de 100 empresas líderes em seus setores compartilharam resultados, aprendizados e desafios, compondo o maior encontro lean do mundo. O evento demonstrou que os avanços alcançados são expressivos, na eficiência das empresas, no desenvolvimento das pessoas e na difusão do sistema em áreas cada vez mais diversas, mas também deixou claro que a jornada está em permanente construção. Produtividade, nesse contexto, permanece como eixo central, condição essencial não apenas para a competitividade empresarial, mas para o fortalecimento do país como um todo. 

O sistema lean deixou de ser apenas um método aplicado à manufatura e se transformou em força social. O que nasceu, nos anos 1990, sobretudo como prática voltada para a indústria automobilística, espalhou-se para setores como tecnologia, saúde, agronegócio, educação, serviços, engenharia e até na advocacia. Essa expansão reflete uma mudança consistente de mentalidades e práticas: sociedades mais produtivas são também mais capazes de gerar riqueza, distribuir oportunidades e criar valor de maneira sustentável. No Brasil, a filosofia lean foi incorporada às estratégias de organizações que valorizam o aprendizado, transformam erros em oportunidades e compartilham suas experiências, demonstrando que a evolução contínua não se resume a um objetivo final, mas a um modo permanente de pensar e agir.

James Womack, que participou do primeiro Lean Summit no Brasil, em 1998, lembrou como o perfil do público se diversificou. Antes concentrado em profissionais da indústria automotiva, hoje é formado por representantes de múltiplos setores. Para ele, o sucesso da transformação não nasce de líderes heróicos, que impõem mudanças de cima para baixo, mas da construção de culturas organizacionais que aprendem em todos os níveis. Mark Reich, que lançou o livro Gestão com Propósito, reforçou que transformação não se sustenta na adoção isolada de ferramentas. Ela depende de um entendimento sistêmico que dá consistência às práticas, orienta decisões e inspira mudanças de liderança. Essa perspectiva ressoou também nas falas de outros executivos presentes ao evento. 

A Embraer destacou como lean sustenta operações de altíssima complexidade, garantindo precisão, qualidade e flexibilidade em processos críticos da indústria aeronáutica. Já a Hydro reforçou que a maior lição do encontro está no aprendizado coletivo, lembrando que lean é prática indispensável para sustentar competitividade e longevidade. A Knauf mostrou como enfrentou os desafios do crescimento com maior engajamento e eficiência na solução de problemas. A WEG relatou retornos sobre capital investido superiores a 30%, número incomum no cenário industrial nacional. A SMC triplicou sua produção em dois anos, sem ampliar o quadro de funcionários, tornando-se referência global dentro de seu grupo. A Ypê elevou a eficiência de 68% para 85% em linhas de produção, enquanto o Grupo Boticário aumentou seu OEE em 24%. 

Esses resultados reforçam que o sistema lean é vital para manter e aumentar a competitividade em setores de alta exigência tecnológica. E que a construção de uma cultura de evolução permanente, mais do que ganhos pontuais, é o caminho para fortalecer a produtividade e engajar equipes em diferentes contextos. 

Essa visão foi complementada por relatos que colocaram as pessoas no centro. A Jost apresentou o “Dojo Lean”, espaço criado para desenvolver habilidades e capacitar colaboradores em diferentes níveis. Na Electrolux, agentes de transformação atuam como multiplicadores de conhecimento, em um processo “formiguinha”, no qual cada pessoa desenvolvida se torna também formadora de outros, vencendo resistências e gerando resultados tangíveis.

Ainda assim, os desafios permanecem. A Sabó destacou a importância de padronizar processos e transferir conhecimento a fornecedores. A ZF ressaltou a necessidade de responder com agilidade nas adversidades do mercado. Outras experiências mostraram a capacidade do sistema lean de se adaptar a diferentes realidades. O grupo supermercadista MonteKali destacou um crescimento acima de dois dígitos com a prática lean, em um setor onde ainda é um desafio, por exemplo, desenvolver um fluxo puxado. A advogada Melissa Folmann contou como padronizou fluxos em seu escritório, aumentando faturamento e melhorando a qualidade de vida da equipe. A Cury Construtora relatou ganhos administrativos e operacionais, por exemplo, ao reduzir o tempo de emissão de boletos de um dia para apenas três minutos. 

A tecnologia emergiu como fronteira inescapável dessa jornada. A WEG demonstrou como a integração entre lean e o uso de novas tecnologias tem gerado ganhos relevantes. O CEO da CI&T definiu o sistema lean como o grande “mediador” na utilização da inteligência artificial, para garantir que isso ocorra de maneira mais estratégica e eficiente, tendo as pessoas como o centro do processo. A Spassu destacou crescimento de 700% em sete anos, impulsionado por práticas de gestão lean, e apresentou o desenvolvimento de uma IA generativa para o Judiciário do Rio de Janeiro, com previsão de elevar em 20% a produtividade da Justiça. 

No setor aéreo, Latam e Gol enfatizaram que a aplicação do sistema tem sido crucial para reduzir custos, aumentar competitividade e melhorar indicadores de pontualidade. No agronegócio, o Sítio Barreiras, maior produtor de bananas do Ceará, mostrou como descentralizar decisões e empoderar agricultores, com previsão de implementar, só este ano, cerca de 1.400 sugestões de melhorias, reafirmando o potencial de lean como “fábrica de gente”. 

O caráter sociotécnico do sistema também foi reforçado. O tema “Explorando as Fronteiras da Gestão” mostrou como, diante da instabilidade econômica, torna-se cada vez mais necessário alinhar estratégia, disciplina no dia a dia e liderança capaz de engajar pessoas. Foram discutidos elementos como hoshin kanri, o uso responsável da tecnologia, a promoção de ambientes de segurança psicológica e a valorização de dimensões humanas, como felicidade no trabalho e participação ativa, todos pontos centrais para sustentar organizações resilientes em um mundo de incertezas. 

Esse conjunto de experiências reforçou que a contribuição da gestão lean vai além dos resultados imediatos para os negócios. Diversos relatos mostraram como práticas mais ágeis e consistentes podem gerar benefícios sociais concretos, apoiando iniciativas educacionais, ampliando o acesso a serviços e promovendo ambientes de trabalho mais sustentáveis. A integração entre eficiência operacional e impacto social apareceu de maneira recorrente, reforçando que eliminar desperdícios não significa apenas melhorar margens, mas liberar energia para gerar benefícios que extrapolam fronteiras organizacionais. 

O que também marcou esta edição foi a forte presença de uma geração mais jovem, que trouxe ao encontro um grau notável de energia, curiosidade e disposição para aprender. Essa vitalidade renovou o ambiente do Summit e reforçou a sensação de continuidade da jornada lean no Brasil. Ao ver tantos novos rostos atentos e engajados, tornou-se evidente que o movimento não se limita às conquistas do passado, mas encontra nas novas gerações a força necessária para sustentar e aprofundar a transformação nas próximas décadas. 

O Lean Summit 2025 foi um marco importante na trajetória de quase 30 anos de prática lean no Brasil. Ao reunir empresas líderes, compartilhar resultados concretos e discutir desafios atuais, o encontro reforçou que há muito a ser aprendido e construído. Num ambiente de disrupção tecnológica, pressões sociais, cadeias instáveis e escassez de talentos, o sistema lean se afirma como tecnologia de gestão indispensável. Mais que método, é uma forma de pensar e agir que assegura resiliência, competitividade e inovação. O compromisso que emerge desta edição é claro: seguir avançando. O futuro competitivo do Brasil dependerá de nossa capacidade de expandir a gestão lean, convertendo produtividade em vantagem competitiva, inovação em valor real e desenvolvimento humano em legado duradouro.

Publicado em 10/09/2025

Autor

Flávio Battaglia
Presidente do Lean Institute Brasil

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