ESTRATÉGIA E GESTÃO

Seja "duro" com desperdícios, mas "leve" com pessoas

Flávio Augusto Picchi
Seja "duro" com desperdícios, mas "leve" com pessoas
O grande problema é que os desperdícios estão em toda parte e há tanto tempo que as pessoas “se acostumam” com eles. Para que uma empresa atenda melhor seus clientes, por meio de processos excelentes, ela precisa desenvolver uma cultura que tire todos dessa letargia

Trata-se de um conceito tão importante que Taiichi Ohno, um dos “pais” do modelo Toyota, embrião do sistema lean, chegou a categorizar os “sete tipos de desperdícios”, os quais, em geral, são encontrados em praticamente todos os processos de qualquer organização.

A mentalidade enxuta, ou lean thinking, tem ajudado inúmeras organizações a serem mais competitivas. Todos reconhecem que uma das características mais fortes desse sistema de gestão, que leva a esse sucesso, é o fato dele desenvolver nas pessoas uma atitude implacável de busca e eliminação dos desperdícios.

Trata-se de um conceito tão importante que Taiichi Ohno, um dos “pais” do modelo Toyota, embrião do sistema lean, chegou a categorizar os “sete tipos de desperdícios”, os quais, em geral, são encontrados em praticamente todos os processos de qualquer organização.

Desperdício é qualquer atividade que consome recursos – como tempo, matéria-prima, espaço, trabalho... –, mas que não agrega valor ao cliente, por exemplo, esperas, retrabalhos, estoques, movimentações desnecessárias e produções em excesso.

O grande problema é que os desperdícios estão em toda parte e há tanto tempo que as pessoas “se acostumam” com eles. Convivem com essas ineficiências todo dia e passam a achar que fazem parte do processo, que não existe outra forma de trabalhar.

Para que uma empresa atenda melhor seus clientes, através de processos excelentes, ela precisa desenvolver uma cultura que tire todos dessa letargia.

Isso começa com os líderes, que precisam ser “duros” com os desperdícios. Isso significa questionar todo e qualquer desperdício que identifique, sem jamais aceitá-los ou achar que são “naturais”, ao mesmo tempo em que desenvolve esse mesmo olhar implacável em todas as pessoas da companhia.

Por exemplo, se num fluxo de administrativo temos frequentes idas e vindas, devido a informações incompletas, o líder daquele processo deve questionar por que isso acontece, onde está sua origem, o que podemos fazer para evitar que isso aconteça etc. E não aceitar respostas do tipo: “isso ocorre em outra área, não temos nada a fazer” ou “já tentamos várias coisas, nada resolveu”.

Mas ser “duro” com os desperdícios não significa ser “duro” com as pessoas. Esse é um erro bastante frequente. Ao identificar um problema, a tendência de muitos líderes é o de procurar culpados. Imediatamente, buscam por “quem deixou isso acontecer” e tendem a achar que mudando pessoas vão resolver o problema. Entretanto, sem compreender as verdadeiras causas dos desvios, os problemas vão continuar, pois, em geral, são decorrências de como os processos e atividades foram concebidos.

Na verdade, a grande mudança de modelo mental é entender que as pessoas são a solução, não o problema. Por isso dizemos que precisamos ser “duros” com os desperdícios, mas “leves” com as pessoas.

Isso não significa ser conivente ou aceitar padrões de desempenho inferiores, mas sim apoiá-las para que se tornem bons caçadores de desperdício.

Por exemplo, se uma equipe está abaixo da meta de produção do dia, e o líder simplesmente dá uma bronca e diz que eles precisam fazer melhor, está sendo “duro” com as pessoas e “leve” com os desperdícios, pois nem estimulou os envolvidos a procurá-los. Isso só gera medo e a tendência de esconder os problemas.

Ser “leve” com as pessoas significa desenvolvê-las, fazer perguntas segundo os métodos de solução de problemas, estimulando-as a usar sua inteligência, melhorando os processos continuamente. Isso é ser “duro” com os desperdícios, estimulando todos a buscá-los onde estejam escondidos e eliminá-los diariamente.

Saber diferenciar as atitudes que precisamos ter com os desperdícios, por um lado, e com as pessoas relacionadas aos processos em que eles ocorrem, por outro, é algo fundamental em termos de gestão.

Isso se torna ainda mais importante nestes tempos de profundas inseguranças e instabilidades; de emoções à flor da pele, em que as relações sociais se mostram a cada dia mais complexas e delicadas.

Se não desenvolvermos em todos uma atitude proativa de melhoria ao nos depararmos com os desperdícios no cotidiano, eles vão se acumular, gerando uma bola de neve de medos e insatisfações, que irá amplificá-los cada vez mais.

Publicado em 02/12/2020

Autor

Flávio Augusto Picchi
Senior Advisor do Lean Institute Brasil