Para o número cada vez maior de empresas iniciando a implementação lean já há um acúmulo de experiências que permite o compartilhamento de algumas lições importantes.
Ainda existem muitas dúvidas sobre por onde começar a implementação. Não há solução mágica ou trajetória única. Porém, há alguns aspectos comuns que podem ser destacados. Cada empresa efetivamente requer uma estratégia particular já que os problemas e as necessidades dos negócios são distintos, os processos com freqüência são específicos, as demandas dos clientes variam consideravelmente dependendo dos tipos de mercados e da competição, e o sistema de gestão é único.
Muitas implementações começam com kaizen pontuais, quase sempre em alguma atividade de manufatura. Os freqüentes bons resultados iniciais motivam, entusiasmam e estimulam as empresas, o que nem sempre garante efeitos sustentados no médio e longo prazos. A atitude “mão na massa” comum nessa área é um bom aprendizado, mas não se trata propriamente de um método adequado de implementação.
Estas atividades iniciais precisam focalizar rapidamente nos fluxos de valor fundamentais, os mais estratégicos, deixar de ter um enfoque em ferramentas isoladas e passar a ter uma visão mais sistêmica e abrangente.
O importante é começar pela necessidade, identificando qual é a crise ou a real precisão do negócio (rentabilidade? atendimento? custos? capacidade?). Após isso, pode-se definir a ferramenta certa para a necessidade certa. Quanto mais relevante for o problema inicial abordado, mais impulso tem a implementação.
Se analisarmos um dos fluxos de valor mais relevantes, da entrada do pedido até a entrega, vamos notar que a manufatura é com freqüência um estágio importante. As ferramentas lean para a produção já são bastante conhecidas e testadas, o que facilita o início no chão de fábrica. Mas antes de procurar criar fluxo e puxar, é necessário fazer uma análise dos problemas de estabilidade (materiais, máquinas, mão-de-obra e métodos).
Uma empresa com um problema crônico de falta de materiais ou com quebras nos equipamentos não pode e não deve iniciar a implementação lean. A resolução destas questões vem antes. Talvez seja mais relevante tratar da movimentação interna de materiais e logística (interna, externa, almoxarifado) no caso de falta crônica de materiais ou iniciar um programa de manutenção para as máquinas e equipamentos que estão quebrando muito e atrapalhando o fluxo. Ou ainda, a empresa pode precisar gerir melhor a força de trabalho com instruções claras, resolver a falta de mão-de-obra qualificada e/ou métodos inadequados que podem estar atrapalhando a produtividade e a qualidade.
Após isso, pode-se buscar resolver os problemas no fluxo de materiais e informações, de modo a criar um fluxo contínuo de acordo com o takt, trabalho padronizado, identificação do processo definidor do ritmo (“pacemaker”), sistemas puxados e nivelados, jidoka, lotes menores e maior capacidade de entrega através da redução dos tempos de troca.
Os problemas mais urgentes e relevantes devem ser priorizados. O foco na estabilidade e na solução de dificuldades pode ser o primeiro passo em sua implementação, desde que se identifiquem quais são elas.
Para garantir a estabilidade é necessário ter uma padronização básica. Mais importante do que sair fazendo melhorias que não se sustentam é definir os padrões ou desempenho esperado e garantir que sejam mantidos.
Comece com o que é relevante, mas faça um piloto com acompanhamento direto da alta administração. Compartilhe o aprendizado, estabilize, exponha visualmente os problemas, analise e reflita, desafie os paradigmas existentes.
A transformação do negócio como um todo é uma etapa posterior. Nesta fase de mudança de valores, cultura e no sistema de gestão é fundamental dominar e usar amplamente o desdobramento das estratégias, o A3 para planejamento e solução de problemas e a implementação de melhorias, quer sejam os constantes e contínuos kaizen ou então os kaikaku radicais, às vezes tão necessários.
Por exemplo, uma empresa de serviços iniciou recentemente a implementação e decidiu focalizar no processo de promoções, a maneira como a empresa lança novos produtos e conceitos. Como resultado, houve uma redução dos lead times em 50%, redução de custos, aumento da taxa de sucesso e redução do estresse. Agora, a empresa está focalizando na experiência de consumo dos clientes finais.
O desenvolvimento de pessoas é essencial, com um novo conjunto de habilidades, comportamentos, qualificações e experiências. O papel da liderança é central. Os diretores devem se envolve diretamente, acompanhar e apoiar a implementação para entender de onde virão os bons resultados. Os gerentes devem ter um foco maior no “gemba” e entender que lean não é algo mais a se fazer, mas a maneira como poderão desenvolver melhor suas atividades. Os coordenadores lean, importantes pelo conhecimento e atitude, ajudam a mudar o comportamento dos outros. Os supervisores próximos dos operadores têm um papel fundamental, freqüentemente subestimado.
Não se deve negligenciar a importância de obter o conhecimento necessário. Mas o foco inicial deve ser nas metas e objetivos. Os métodos e as ferramentas vêm depois.
Os benefícios típicos da implementação lean, como melhores resultados financeiros, o aumento da satisfação dos clientes, as melhorias da qualidade e a redução dos “lead times” valem a pena.
José Roberto Ferro
Presidente
Lean Institute Brasil