ESTRATÉGIA E GESTÃO

Hoshin vs. Caos

Jim Womack
Hoshin vs. Caos

Em meu artigo O desdobramento do Hoshin, escrito em 2018, quando o mundo parecia um lugar mais estável, tentei ilustrar como a Toyota desdobra o hoshin desde os níveis mais altos da empresa até a base, onde o trabalho que realmente cria valor é realizado.

O artigo foi baseado em uma visita a uma fábrica da Toyota no Japão, no verão de 2018, onde os trabalhadores da linha de frente estavam empenhados em atingir seus objetivos do hoshin desdobrado: reduzir custos para liberar recursos financeiros necessários para enfrentar uma “disrupção cíclica que ocorre a cada século” na indústria automotiva. Essa disrupção era (e continua sendo) a combinação da transição para veículos de baixa ou zero emissão de carbono, autonomia, compartilhamento de veículos (possibilitado pela autonomia e necessário para reduzir o custo dos veículos elétricos e autônomos) e hiperconectividade de informações entre empresas, veículos e usuários nesta nova era da mobilidade.

Foi realizado um kaizen de três meses na linha de frente (em uma seção de uma linha de montagem) para reduzir custos e, ao mesmo tempo, aumentar a capacidade de produção e atender à meta do hoshin. Os resultados foram muito impressionantes, e o meu plano era voltar em um ou dois anos para acompanhar o progresso. Mas então veio a pandemia (que adiou meu retorno indefinidamente), junto com a desaceleração na introdução da autonomia (em que os robotáxis deveriam pagar aos proprietários pelo custo da autonomia), um salto dramático nas promessas das montadoras de adotar veículos elétricos (VEs), mudanças contínuas nas regras de emissão de CO₂ impostas pelos governos e, mais recentemente, uma resposta do cliente aos veículos elétricos bem mais fraca do que o esperado. 

Em resumo, a disrupção continua, mas acompanhada de um grande caos na implementação das novas tecnologias necessárias em uma indústria com requisitos de investimento maciços e ciclos de desenvolvimento de produtos com novas tecnologias que duram uma década.

Como o planejamento hoshin funciona em meio a tanto caos? A Toyota tem a resposta: sempre trabalhar com um portfólio de contramedidas até o ponto em que possam ser testadas pelos consumidores, antes de optar por uma única solução. (Desenvolver um produto mínimo viável no setor de mídia social é algo pequeno — veja o livro A Startup Enxuta para exemplos, mas desenvolver um produto mínimo viável na indústria automotiva é algo enorme.) Assim, a Toyota chegou a cogitar o desenvolvimento de 28 novos veículos elétricos para lançamento nos anos seguintes, enquanto o restante da indústria caminhava em massa rumo ao “precipício dos VEs”. Mas recuou rapidamente quando a resposta inicial dos clientes foi negativa. (Eu mesmo possuo um dos primeiros modelos — o Toyota bZ4X — e fui uma das vozes críticas: preço muito alto, resultado de um projeto ainda imaturo e custoso, e autonomia insuficiente... embora, de resto, o carro seja realmente brilhante!)

Em vez de saltar para uma única solução (os VEs), a Toyota continuou seu trabalho no desenvolvimento de uma variedade de produtos mínimos viáveis: veículos movidos a célula de combustível de hidrogênio; híbridos tradicionais; híbridos plug-in; veículos com motor a combustão interna (ICE) movidos a hidrogênio e VEs de segunda geração com uma ampla gama de tecnologias de bateria, incluindo baterias de lítio em estado sólido. Enquanto isso, seus concorrentes na América do Norte e na Europa recuam de seus investimentos maciços em VEs e novas fábricas de baterias para defender sua posição com híbridos e híbridos plug-in, tecnologias nas quais têm pouca experiência. (O mercado chinês é diferente da América do Norte e da Europa: o governo tem profundas preocupações geopolíticas sobre as grandes importações de petróleo devido ao crescimento acelerado da frota de veículos automotores e determinou que a indústria automotiva será eletrificada o mais rápido possível. Ali, não há confusão sobre os objetivos do hoshin: qualquer empresa que queira competir no mercado chinês precisa oferecer uma linha completa de veículos elétricos).

O ponto mais importante é que o planejamento hoshin da Toyota identificou corretamente o único fator necessário, independentemente de qual contramedida se mostrasse mais promissora: muito dinheiro para financiar experimentos caros. E o processo de desdobramento de seu hoshin gerador de capital, conforme expliquei em “O desdobramento do Hoshin”, não mudou em nada. Um hoshin robusto, com desdobramento disciplinado do topo à base (top-to-bottom) pode navegar mesmo em meio ao caos.

Publicado em 28/10/2025

Autor

Jim Womack
Fundador e consultor sênior do Lean Enterprise Institute.

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