SAÚDE

“Nova pandemia” exige acentuar a gestão lean na saúde

Flávio Battaglia e Paloma Rubinato Perez
“Nova pandemia” exige acentuar a gestão lean na saúde
Porque as organizações do setor estão enfrentando contextos distintos, mas igualmente complexos aos dos anos recentes; e como a gestão lean pode dar respostas definitivas para a evolução do cuidado

Há uma crise de sustentabilidade no atual sistema de saúde, fruto de fatores já conhecidos, mas ainda pouco compreendidos. Isso está gerando novas dificuldades e prejuízos às organizações. E maximizam, ainda mais, a necessidade de melhorar sistemas de gestão e, portanto, de se adotar e otimizar a jornada lean.

São vários os fatores que ocasionam esse novo fenômeno.

Um deles reúne recentes mudanças em características dos indivíduos que buscam serviços de saúde. Por exemplo, o aumento da média de faixa etária, com um número cada vez maior de pessoas com mais idade, gerando uma mudança no perfil demográfico de pacientes.

A quantidade de indivíduos com mais de 60 anos vem crescendo e deve aumentar ainda mais nos próximos anos. É um público peculiar. Ele fica mais tempo no hospital, com mais comorbidades e maiores custos às organizações.

Também há uma recente alteração na relação das pessoas com os tratamentos de saúde. Elas apresentam, cada vez mais, preocupação e busca de prevenção e atendimento. Têm maior acesso à informação, tanto sobre saúde, quanto sobre as organizações do setor. E, portanto, revelam uma exigência maior e mais sofisticada com relação à experiência que precisam ou querem ter no atendimento da saúde.

Tudo isso somado às consequências de um “represamento” de procedimentos. O fenômeno é, ainda, uma consequência dos recentes anos de pandemia. E que tem gerado maior frequência de uso dos sistemas de saúde. Isso aumentou tanto a sinistralidade dos planos de saúde, quanto as demandas no SUS (Sistema Único de Saúde). Assim, setores privados e públicos se encontram, novamente, um tanto despreparados para equacionar estruturas operacionais e necessidades financeiras.;

Isso se problematiza ainda mais com novas e recentes questões contextuais que impactam a “saúde financeira” das organizações. Por exemplo, as instabilidades inflacionárias que associadas ao aumento da sinistralidade das operadoras provocam dificuldades nos repasses às organizações. Que, por sua vez, ficam com “caixas” cada vez menores para  realizar e operacionalizar suas entregas.

Na esteira desse processo, do lado das organizações como hospitais e clínicas, o aumento do piso salarial da enfermagem, os incrementos dos custos com equipamentos, insumos... diminuem os investimentos que poderiam ser utilizados para melhorar as “entregas” aos pacientes e acompanhantes.

Assim, toda essa “nova complexidade” exige, talvez como nunca, iniciar ou acentuar a implementação lean. Só com a evolução da gestão é que se vai conseguir, efetivamente, planejar, gerenciar e entregar mais qualidade, segurança e experiência positiva,  considerando que teremos os mesmos recursos ou menos. O lean é, mais do que nunca, a mais eficiente “resposta” aos cada vez mais complexos contextos do setor da saúde.

Como se conseguir isso? Em várias frentes.

Por exemplo, fortalecendo a elaboração, o desdobramento e a execução da estratégia. Isso significa começar com um olhar lean já na confecção de uma estratégia bem definida, ou seja um hoshin kanri bem pensado e executado. E amarrado por um alinhamento, por toda a organização, dos propósitos que se precisa e se deseja atingir.

O Gerenciamento Diário (GD) também é uma ferramenta poderosa e bem-sucedida para apoiar as instituições nessa transformação necessária. Quando bem elaborado, distribuído e efetivamente usado por toda a organização, ele gera impactos positivos. Auxilia as descobertas dos problemas e direciona para execução de contramedidas efetivas. Fortalece também a segurança psicológica entre líderes e liderados.

Não é novidade que o setor de saúde sempre foi historicamente complexo. No entanto, os últimos anos geraram novos rumos jamais previstos.

Na época da pandemia, nos anos de 2020, 2021 e 2022, os esforços se concentraram em conhecer e tratar a nova doença. E a expectativa era, em 2023, voltar ao fluxo de 2019 e retomar a perda de rentabilidade e caixa. No entanto, isso não aconteceu. O ano que está acabando trouxe uma vivência nesses novos elementos de complexidade aqui já relatados. E que só deverão se intensificar para os próximos períodos. É como se fosse uma “nova pandemia”. Não de uma nova doença, é claro, mas de problemas e desafios de gestão.

Nesse contexto, é preocupante notar que ainda são minoria as organizações de saúde que apostam, de maneira integral, na implementação lean. Embora já se possa observar um crescimento importante nesse sentido, são raras às que tenham jornadas realmente avançadas para mostrar.

Assim, não há outra alternativa. É preciso intensificar a melhoria de gestão do cuidado. Fortalecer a revisão cotidiana dos processos. Aumentar a capacitação das equipes, não apenas com relação aos desafios dos diagnósticos e tratamentos, mas também sobre como gerenciar tudo isso.

O desafio, portanto, é centrar o olhar na gestão para minimizar os impactos econômicos negativos da “nova pandemia”. Para, assim, conseguir entregar mais valor, com menos desperdícios. Só dessa maneira teremos sucessos na consolidação de um sistema realmente eficiente de gestão da saúde.

Publicado em 13/11/2023

Autores

Flávio Battaglia
Presidente do Lean Institute Brasil
Paloma Rubinato Perez
Head para Saúde no Lean Institute Brasil

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