Conforme mais e mais empresas se interessam pela transformação lean, um dos obstáculos mais sérios que tem surgido para uma jornada de sucesso é o estilo de liderança predominante nas companhias.
Há vários elementos importantes na liderança lean, conforme já destacamos em outras colunas. Mas vamos aqui destacar dois deles: a atitude gemba e a transformação de líderes em coaches.
Gemba é uma expressão japonesa que significa “o lugar onde as coisas acontecem”. Outro termo, também japonês, usado com conotação semelhante é genchi gembutsu, significando que é preciso que você mesmo verifique os fatos para ter certeza de que se tem a informação certa necessária para tomar uma boa decisão em bases sólidas.
Isso evita a falsa sensação de que as coisas estão sob controle porque há informações a disposição, quando isso muitas vezes não representa bem a realidade, porque os fatos reais não foram considerados ou entendidos.
Pode ser numa fábrica, num escritório de engenharia, numa área de atendimento ao cliente, num call center, num centro cirúrgico, num guichê de uma empresa aérea...
As lideranças na empresa lean não podem se basear apenas em métricas e indicadores de relatórios ou power points criativos discutidos em salas de reunião. Elas devem ir aos locais onde o valor para o cliente é gerado, e onde os problemas acontecem, e ver com seus próprios olhos. Isso permite uma melhor visualização e um melhor entendimento dos problemas reais, contribuindo, assim, para a solução. E para permitir que se façam melhorias.
Mas há muita confusão com relação a isso. Comumente, há lideranças que acham que devem ir aos locais para elas próprias resolverem os problemas. Ou, então, para chamar a atenção dos colaboradores, intimidando e ameaçando no caso de objetivos não atingidos e resultados inadequados.
Assim, devemos mudar os modelos mentais e as atitudes para que a ida ao gemba por parte das lideranças, em seus vários níveis, possa ser eficaz. É preciso estimular as pessoas a assumirem responsabilidades e tomarem iniciativa, e não a simplesmente terem a postura de esperar e seguir “ordens de cima”. Para isso, é preciso que o sistema de gestão tenha elementos que apoiem essa dinâmica.
Nesse sentido, o líder lean deve ser um coach, um treinador que desenvolva pessoas, que estimule seus colaboradores a, eles próprios, analisarem as causas dos problemas e chegarem às soluções mais apropriadas.
Não se trata apenas de um processo abstrato e tradicional de coaching, para firmar melhores pessoas, mas uma maneira efetiva de criar uma cultura de resolução de problemas e de melhorias e de criar e enfrentar desafios permanentes.
Para isso acontecer, a liderança e o sistema de gestão devem incentivar a exposição clara de problemas e, portanto, não estimular o comportamento de escondê-los, propiciando, assim, a transparência através da gestão visual. E deve eliminar o “medo de revelar problemas” – tão comum – ao deixar claro na companhia que os problemas estão nos processos e não nas pessoas. O líder deve ser capaz de ensinar e apoiar mais do que mandar e controlar.
Nesse sentido, não se trata do líder que visa reforçar suas credenciais e qualificações individuais para, assim, “subir” na hierarquia da empresa ou “saltar” de companhia em companhia. Tampouco falamos do líder que está sempre em busca de melhores oportunidades, colocando sua carreira e os resultados organizacionais de curto prazo em primeiro lugar. Não se trata daquele que não foca em sua contribuição à organização e na geração de valor ao cliente.
Assim, também há muitas dificuldades para mudar hábitos e crenças fundamentais. Os fatores que levaram os líderes às suas posições atuais quase sempre são os mesmos que precisam ser alterados profundamente.
As empresas tendem a estimular uma perspectiva de crescimento individual, quase sempre focalizada em um pretenso “talento” individual que torna difícil focalizar o esforço fundamental da liderança no desenvolvimento das habilidades e conhecimento dos seus colaboradores mais próximos.
Ir ao gemba e ser um coach são dois dos desafios mais importantes da transformação da liderança para dar sustentação a uma empresa mais capaz de crescer em bases sólidas, mantendo-se competitiva no longo prazo. Se conseguirmos superá-los, a jornada da transformação lean tenderá a elevar as organizações a níveis de desempenho muito superiores.
Fonte: Revista Época Negócios