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Gestão é diferencial no Carnaval

Num desfile de escolas de samba, recursos financeiros e tecnologias avançadas nem sempre ganham.

Mais do que uma demonstração de excelente Carnaval, a Unidos da Tijuca, campeã do Rio de Janeiro (RJ), mostrou que a gestão é o diferencial competitivo. Tanto é verdade que, após a vitória no concurso das escolas de samba deste ano, o carnavalesco da escola, Paulo Barros, disse que a conquista foi fruto de “muito trabalho e de uma boa administração”.

Trabalhar duro, possivelmente todas as escolas de samba o fazem. Mas nem sempre isso é garantia de sucesso e vitória. É salutar saber que, na “indústria do Carnaval”, está consolidada a ideia da importância da gestão. Mas são poucas as que têm uma gestão avançada, apesar do processo de profissionalização pelo qual todas tem passado nos últimos anos (ver nossa coluna de fevereiro de 2013).

O que seria, então, essa “boa gestão” carnavalesca? Em outras palavras, como é e o que precisa ser melhorado no “processo” de produção de um desfile de uma escola de samba?

A primeira lição, talvez, seja o sólido processo de “planejamento” que se percebe ocorrer nas grandes escolas de sambas. Sabe-se a data do carnaval com anos de antecedência, e as regras têm mudado pouco ano após ano. Assim, é possível começar a planejar com seriedade o desfile do próximo ano no dia seguinte. Ou até mesmo antes.

O tema do enredo pode ser definido com grande antecedência, o que poderá ser desenvolvido e refinado durante todo o ano e puxará o resto dos processos, atividades e produtos, o que resultará em um desfile integrado, harmonioso, de qualidade e com sucesso. Ou seja, todos os quesitos essenciais que são mensurados na árdua competição serão trabalhados exaustivamente ao longo do ano. Esse planejamento deve ser detalhado, mas também sofrerá ajustes ao longo dos meses seguintes.

Após isso, o esforço é executar as ações planejadas, acompanhadas de perto pelo carnavalesco, com controles e ajustes. Ele é o maestro ao longo do ano, integrando o tema/enredo do samba aos carros alegóricos, às fantasias etc. Se de um lado, para ter sucesso, o acompanhamento dos múltiplos detalhes é fundamental, do outro a capacidade de inspirar do carnavalesco é central. Temas a princípio pouco interessantes podem ter abordagens poderosas assim como temas inspirados podem gerar desfiles pobres.

Porém há estilos de liderança de carnavalescos extremamente autocráticos que não permitem sugestões e ideias dos participantes. São as “prima donas” temperamentais e centralizadoras que contrastam com os carnavalescos, como o vencedor de 2014, que envolvem, engajam, mas apontam os caminhos, inspiram e estimulam os participantes a sugerirem melhorias e ideias próprias dentro do espírito norteador do carnavalesco.

Isso é fundamental para criar um ambiente propício para estimular as pessoas a criarem e trabalharem adequadamente. Torna-se cada vez mais evidente que elas fazem isso estimulando e envolvendo os integrantes na paixão, na emoção gerada pelo que fazem, na luta por um ideal, ou seja, a construção de um Carnaval feito por tal comunidade. E, com isso, conseguem ter algumas das equipes mais motivadas que se tem notícia: as que trabalham nos barracões carnavalescos.

A produção de carros alegóricos tornou-se um processo cada vez mais sofisticado artística e tecnologicamente. No final do ano passado, visitei uma sofisticada empresa, no Rio de Janeiro, que produz equipamentos para a extração de petróleo em alto-mar. Para fazer uma maquete em tamanho real de um de seus produtos, antes visualizado apenas no computador, ela recorreu a uma empresa que fornecia os carros alegóricos para muitas escolas de samba. Trata-se da única fornecedora desse tipo de serviço no Rio.

Parece evidente que uma escola de samba não funcionaria como se deve se os foliões trabalhassem por obrigação. Trabalhando por uma causa, pela emoção que se tem ao trabalhar, as pessoas certamente têm responsabilidades mais claras.

Outro processo essencial é a capacidade de gestão dos fornecedores que entregam produtos e serviços à escola.

Um desfile é um evento único e ao vivo. Não se pode errar, pois não se pode corrigir a tempo. As escolas de samba bem-sucedidas sabem que precisam fazer tudo “certo da primeira vez”, pois a segunda chance praticamente não existe.

Porém um diferencial essencial é a capacidade de inovação para emocionar e surpreender. Fazer tudo certo, integrado, harmônico, de bom gosto em combinação com a necessidade de despertar paixões é essencial para o sucesso nos precisos oitenta e dois minutos do desfile.

As escolas recebem recursos financeiros públicos e, também, têm esquemas próprios de arrecadação. A quantidade de recursos disponíveis certamente é um fator crítico, mas não há indícios de que as escolas que gastam mais ganhem mais carnavais. Recursos financeiros e tecnologias avançadas nem sempre ganham, às vezes perdendo de soluções simples, baratas, porém mais criativas advindas de uma boa gestão.

Atrevamo-nos a dizer, então, que boa gestão ganha carnavais!!

Fonte: Revista Época NEGÓCIOS

Fonte: Época Negócios
Publicado em 10/03/2014