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O Papa é lean?

O estilo de liderança e gestão de Francisco estão próximos da administração enxuta

A vinda do Papa Francisco ao Brasil após três meses à frente da Igreja Católica, em sua primeira viagem internacional para a Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro, permite uma reflexão sobre o que foi possível perceber com relação às mudanças na liderança e administração dessa enorme e tradicional organização multinacional.

Por ocasião da sua posse em março, escrevemos nossa coluna “Desafios gerenciais do novo Papa”, procurando mostrar os desafios que ele tinha pela frente no sentido de recuperar o prestígio e a credibilidade da Igreja Católica, que vêm sendo perdidos ao longo do tempo.

Tínhamos sugerido que o Papa poderia focalizar nos três elementos essenciais de qualquer organização, ou seja, no propósito e valores da organização, nos seus processos administrativos e na gestão de seus colaboradores.

Mesmo nesse curto período de tempo já foi possível perceber algumas mudanças significativas, tais como:

Definição de propósito e valores: O novo Papa definiu claramente as expectativas de mudança e a renovação da sua organização. Algumas são muito visíveis, como sua maior orientação para fora da Igreja, tratando de forma mais prioritária alguns problemas mundiais, como a paz, a miséria etc. E apresentando uma cooperação mais estreita e aberta com outras igrejas.

As mudanças mais notadas pelos fiéis e mesmo fora da organização é a redução da ostentação e recusa ao luxo, procurando viver uma vida pessoal mais simples e mais próxima das pessoas. Como dizemos na filosofia lean, os líderes devem estar próximos do gemba, o local onde as coisas acontecem.

Essas ações em direção a maior humildade e maior despojamento têm sido acentuadas no dia a dia na Itália, mostrando claramente um novo estilo pessoal.

Sabemos que a liderança pelo exemplo é muito poderosa. Assim, a mensagem de um Papa mais humano, mais ligado às necessidades reais das pessoas, mais simples, acena para um novo e importante rumo.

As consequências imediatas têm sido uma maior popularidade em suas aparições em Roma, dobrando o número de público presente nas cerimônias oficiais.

Além disso, tem havido uma movimentação em direção a uma maior descentralização no sentido de dar maior autonomia e poder às bases locais da Igreja. Aprender a ouvir mais parece estar predominando, sem abrir mão dos princípios e orientações essenciais. Saber perguntar é um dos atributos essenciais da liderança lean.

Externamente, o esforço com a Jornada Mundial da Juventude representa a busca de novos mercados como o dos jovens e nos países em desenvolvimento, uma forma de enfrentar a concorrência com as outras religiões e a redução do engajamento dos países desenvolvidos.

Processos e estrutura administrativa: Alguns passos importantes foram dados para a reestruturação administrativa. A complexa e nebulosa burocracia do Vaticano tem sido um dos pontos de foco do novo Papa.

Foi criada uma comissão para reformar a sua estrutura administrativa, cujo objetivo é simplificar e racionalizar os órgãos existentes e estabelecer um planejamento e uma gestão financeira mais adequados.

O próprio estilo frugal do novo Papa ajuda na direção de evitar gastos supérfluos e desnecessários. Com isso, o Papa Francisco pretende racionalizar os processos administrativos, reduzir custos e aumentar a transparência nos processos de aquisição de bens e serviços, além de melhorar a administração do vasto patrimônio da Igreja Católica.

A reforma do Banco do Vaticano é uma das tarefas mais importantes. Se o foco estiver além das estruturas e orientar-se em direção aos processos horizontais, teremos aí mais uma analogia a formas de mudança e melhoria dentro da filosofia lean.

Gestão das Pessoas: Em relação aos cruciais temas de gestão das pessoas ligadas à administração e na linha de frente da igreja (padres e bispos), tem havido uma demonstração de que a tolerância e a ausência de punições a atos incongruentes com os valores da Igreja é coisa do passado. Esperamos que eventualmente novas situações emerjam para testar concretamente essa mudança no discurso.

Quanto à punição para quem se comportar de forma inadequada, só saberemos se houve alguma mudança na atitude da igreja quando eventualmente novos casos surgirem.

O respeito às pessoas, quer sejam os colaboradores, quer sejam os fiéis, pode ter papel fundamental nessa etapa da Igreja Católica.

Ainda não ficou claro se haverá mudanças mais profundas no acesso e na carreira da Igreja, além de outras mudanças, como permitir o casamento dos padres e o acesso de mulheres à carreira.

Em resumo, a agenda de mudanças para a Igreja Católica navegar no século XXI é enorme. Esse tem sido um começo promissor. Alguns desses novos elementos no estilo de liderança e gestão estão próximos da abordagem lean.

Essa visita ao Brasil deve demonstrar mais claramente quais são esses novos tempos da Igreja Católica e a sua nova liderança e gestão na busca de sobreviver aos novos tempos, adaptando-se às mudanças e ao mesmo tempo em que mantem seus valores essenciais.

 

Fonte: Revista Época NEGÓCIOS

Fonte: Época Negócios
Publicado em 23/07/2013