Para os católicos, a Páscoa tem um significado de recomeço ou nova vida. Talvez seja isso, simbolicamente, que pode representar o novo papa como líder supremo da Igreja Católica, a mais antiga e uma das mais poderosas organizações do mundo.
Escolhido há poucos dias, o novo líder tem pela frente a difícil missão de recuperar parte do prestígio e reputação perdidos nos últimos tempos, em particular nesse período recente de grande turbulência que culminou com a renúncia surpreendente do papa anterior.
Antes de qualquer coisa, o papa é líder e gestor de uma organização multinacional sem fins lucrativos com mais de 1 bilhão de seguidores/fiéis/clientes, contando com um quadro de colaboradores diretos e indiretos da ordem de centenas de milhares, uma missão espiritual, um poder acumulado que a torna mais poderosa que muitos Estados-Nações, um orçamento bilionário, símbolos e logo universalmente conhecidos e uma presença estabelecida em praticamente todos os países.
E também há organizações que competem com ela, algumas em rápido crescimento nos mercados dos países em desenvolvimento, onde a Igreja Católica ainda mantém uma base sólida, embora declinante, em face dos problemas internos, principalmente os escândalos sexuais e também em face da competição de novas igrejas mais agressivas comercialmente e inovadoras tecnicamente (estratégias de comunicação, carreiras dos colaboradores, esquema de franquias etc.).
A escolha de um papa das Américas talvez já seja parte da estratégia de se aproximar de seus mercados potencialmente mais fortes. Ainda que haja um forte desequilíbrio de representação entre países em desenvolvimento, em ampla minoria no Conselho de Cardeais (cerca de 25% dos votantes) onde estão a maioria dos fiéis/clientes (mais de 75%), acabou sendo escolhido um não europeu pela primeira vez na história.
A idade do novo papa, 76 anos, é muito superior a idade de aposentadoria obrigatória de presidentes de muitas organizações multinacionais, embora um pouco mais jovem do que o anterior, escolhido aos 78 anos. Esse foi um dos argumentos para a demissão do papa anterior, sua idade avançada e sua incapacidade física para enfrentar os desafios da Igreja Católica.
O novo papa tem dado alguns sinais de mudança, como uma postura mais humilde, uma preocupação menor com a pompa, os luxos e liturgia do cargo, tão valorizados pela administração anterior. A liderança pelo exemplo é sempre mais poderosa do que pela palavra.
Até agora, temos visto apenas essa mudança de um estilo de liderança que antes era hermética, pouco comunicativa e olhava muito para dentro da organização, para uma liderança mais popular, aberta e carismática, importante para reorientar o foco e a missão da organização.
Mas isso é pouco. O novo papa e sua equipe de colaboradores mais diretos devem fazer o mesmo esforço de um presidente que acaba de assumir uma empresa tradicional.
O novo papa dificilmente terá sucesso se não focalizar no propósito da sua organização, nos seus processos internos e nas suas pessoas. Deve começar antes realizando um diagnóstico profundo de seus problemas e necessidades, definir as prioridades e estabelecer e implementar as mudanças que forem necessárias para, depois, acompanhar e corrigir. Em última instância, o novo papa deveria rodar o ciclo do PDCA – sigla das expressões em inglês plan (planejar), do (fazer), check (checar) e act (agir / corrigir).
Começando pelo propósito que envolve a missão, visão, princípios e valores. Até que ponto a falta de uma unificação em todos os países ou mesmo dentro de cada país em que se convivem desde técnicas de comunicação em massa com padres cantores e artistas com os grupos mais conservadores e tradicionais é um problema? Ou quanta variedade é possível existir tendo em vista a complexidade das demandas das diferentes sociedades?
Nenhuma organização é totalmente transparente, mas a Igreja Católica tem se baseado em demasia no sigilo como, por exemplo, no caso do dossiê que foi comentado por ocasião da renúncia do papa anterior. Comunicação clara com seus colaboradores e clientes pode ajudar no futuro para amenizar ambiguidades.
Em seguida, passando pelos processos, que envolveria desde a gestão de seu quadro de colaboradores (permitir o casamento dos padres e o acesso de mulheres a carreira parecem ser muito “avançado”) a uma maneira mais clara e incisiva de lidar com os escândalos sexuais até melhorar a gestão financeira, recentemente colocada em cheque com as crises do Banco do Vaticano.
E ainda, a organização precisa definir que tipo de pessoas quer atrair, como selecionar, quais políticas vai utilizar para retê-las e motivá-las e utilizar diversas maneiras de promovê-las. E o que fazer com aqueles que não se comportam adequadamente. Proteger ou realocar, como tem sido o caso até o momento, ou afastá-los por sua inadequação aos princípios éticos, fundamental em uma organização orientada pela missão e não por prioridades materiais.
O artigo “Pope, CEO” publicado na revista The Economist do dia 9 de março afirma que o novo papa precisa ser capaz de implementar inovações organizacionais e estratégicas radicais. Os conservadores dirão que a Igreja católica tem se mantido à tona por tanto tempo devido a sua capacidade de ser fiel a princípios, valores e técnicas.
Vamos ver o que o novo líder tem a dizer. E mais importante, o que vai fazer. Só o tempo, e talvez, no longo prazo, vai dizer quem tem razão.
Fonte: Revista Época NEGÓCIOS