Fui visitar uma unidade da Policia Militar (PM) do Vale do Paraíba, no estado de São Paulo, em pleno auge da onda de ataques e homicídios. Pude perceber os esforços de melhoria da gestão dando resultados concretos.
Uma simples mudança na prática de elaboração de relatórios internos evitando redundâncias e retrabalhos eliminou uma carga de trabalho administrativo inútil, liberando os policiais para irem às ruas realizar o trabalho de prevenção e repressão.
A continuidade desse trabalho, desejo da direção da corporação, poderá render melhorias substanciais na gestão da PM e ajudará na luta para a melhoria da segurança, pois um maior efetivo estará na linha de frente e não em atividades burocráticas irrelevantes.
Enquanto isso, a segurança pública voltou a chamar a atenção com vigor da mídia e da população em São Paulo e em Santa Catarina nesse último mês, com as dezenas de mortes de civis e policiais, incêndios de ônibus, ataques a postos policiais etc.
Essa situação fez com que algumas autoridades se preocupassem em dar uma “satisfação” à opinião pública com medidas midiáticas, de olho mais nas urnas do futuro do que nas ruas de hoje.
Trata-se de um tema que voltou às manchetes sem nunca ter saído. O que aconteceu é que nos acostumamos com a banalização da violência e da insegurança. Achamos normal. Afinal, basta olhar para a quantidade de programas diários de TV dedicados ao assunto. Ou perguntar quem nunca sofreu um assalto ou foi roubado? Se você teve sorte, então, deve ter alguém na família ou um amigo.
O problema é antigo e sua persistência é resultado da inércia governamental e da falta de clamor público. Os custos econômicos, sociais e psicológicos da violência para toda a sociedade são enormes e deveriam requerer ações mais eficazes.
As soluções vêm sendo discutidas há anos sem que se consiga entender claramente os problemas e suas causas raízes para, a partir daí, pensar em soluções eficazes.
Nesses últimos meses, tive a oportunidade de conhecer mais profundamente alguns desses problemas de base e algumas soluções possíveis. A partir de um trabalho voluntário, tenho podido conhecer com mais detalhes um programa de apoio ao menor infrator em medida socioeducativa. Trata-se de um programa para tentar evitar que menores infratores voltem a ter problemas com a lei e oferecer caminhos alternativos sem recorrer a privações da liberdade ou internações.
A iniciativa à qual me refiro é administrada por uma associação ligada a uma comunidade que costumava ser uma referência negativa em violência e insegurança, mas cujos índices melhoraram substancialmente nos últimos anos, em grande medida, graças a essa organização comunitária.
Notamos que a atratividade do mundo do crime tende a ser muito mais forte do que as ações educativas, econômicas e sociais que esse programa oferece. Assim, esse menor infrator tem grandes chances de seguir no mundo do crime na medida em que as medidas socioeducativas e econômicas utilizadas têm pouca eficácia.
Uma situação preocupante e, ao mesmo tempo, uma grande oportunidade de buscar reduzir o mal pela raiz, oferecendo alternativas a esses jovens. Se esse programa for mais bem gerenciado, poderemos ter algumas portas abertas que oferecerão novos caminhos a esses menores.
O debate entre uma maior brandura ou maior rigor e punição ou sugestões de mudanças na legislação fica ofuscado se efetivamente usarmos os recursos do Estado para gerenciar melhor esses programas.
Mas ainda há muito a progredir no sentido de sensibilizar a sociedade para a gravidade do problema. Uma pequena história que certa vez vivenciei diz muito sobre a nossa “aceitação” da insegurança.
Um norte-americano chegou ao Brasil há uma década e, ao ser levado a uma estância de turismo no sul do país, no caminho do aeroporto até o hotel, o guia se esmerou em explicar a história da região.
Em um determinado momento das narrativas, o guia disse: “Aqui em nossa cidade, você pode até andar sozinho à noite”. O estrangeiro não entendeu a observação. Afinal, para ele, era normal poder andar sozinho à noite na grande maioria das cidades estadunidenses. Não entendeu por que isso seria uma atração especial e motivo de menção.
Ao chegar ao hotel e questionar seus amigos brasileiros, ficou sabendo que o normal no Brasil é evitar caminhar à noite, na maioria das cidades. Até quando vamos achar a insegurança e a privação do direito de ir e vir como coisas normais para os cidadãos?
O trabalho na PM e dessa associação são duas frentes de atuação importantes, uma liberando recursos escassos da PM para aquilo que realmente importa e a outra de prevenção do crime, com a abertura de outra porta para os menores infratores que não a do crime quando ainda existe essa possibilidade.
Mas são pequenas frentes à magnitude do problema. A luta será árdua, pois o problema da segurança é complexo, envolvendo dimensões culturais, legais, sociais etc. Passos sólidos como esses ajudarão bastante. Os governos têm muito ainda a aprender na busca de fazer mais com menos e de usar métodos mais científicos de gestão para resolver seus problemas.
Fonte: Revista Época NEGÓCIOS