EDUCAÇÃO

Lean exige persistência

Robson Gouveia e Gislene Garcia
Conceitos e aprendizados essenciais para sua transformação lean

A Anima é um grupo educacional de ensino superior que já vem há alguns anos implementando a filosofia lean em suas atividades administrativas. Já vimos como ela melhorou e tornou mais eficiente sua comunicação com os alunos e já fizemos uma entrevista com a diretora de relacionamento com o aluno do grupo. Desta vez, voltamos a focar nossa atenção na Anima para ver como a persistência é importante na jornada lean e como a caminhada nunca é fácil. Neste primeiro artigo de uma trilogia, temos a oportunidade de aprender com uma tortuosa caminhada lean que iniciou no Núcleo de Educação a Distância (EaD) e se concretizou na Gestão de Provas.

Conforme a Anima iniciava sua jornada lean, o grupo começou a fazer apresentações e exposições dos A3 que foram desenvolvidos no primeiro ciclo lean. Essa era uma excelente oportunidade para que todas as áreas da Anima, principalmente aquelas que ainda não estavam envolvidas nos esforços de transformação, enxergassem os primeiros resultados da aplicação da filosofia no grupo e começassem a imaginar como seria aplicar o lean em suas respectivas áreas.

No segundo ciclo acadêmico de 2016, o Núcleo de EaD da Anima entrou na jornada lean com dois projetos priorizados: produção de conteúdo e avaliação. Havia uma enorme empolgação no setor motivados pelos projetos desenvolvidos no primeiro ciclo, contudo nenhum dos projetos obteve muito sucesso inicialmente. O projeto voltado para o processo avaliativo foi, inclusive, interrompido para resolução de um sério problema que demandou a dedicação, quase que exclusiva, de todo o time.

Apesar da interrupção abrupta do projeto lean – Avaliação, o grupo acreditava nas possibilidades de melhoria que a metodologia lean poderia trazer para a Anima como um todo e, em especial para o processo avaliativo, que necessitava urgentemente de uma intervenção. Pouco tempo depois, no segundo semestre de 2017, toda a vice presidência acadêmica passou por uma reestruturação e o processo avaliativo que, até então, era conduzido pelo Núcleo de EaD passa a ser realizado pelo Gestão de Provas, que trazia em seu escopo de trabalho não mais apenas as provas das disciplinas ofertadas online, mas, também todas as provas institucionais. Nesse mesmo período a Anima iniciou seu terceiro ciclo lean e, novamente, o processo avaliativo foi um dos projetos priorizados.

O time sabia que era necessário levar o projeto até o fim, não apenas para cumprir uma entrega do projeto, mas, sim por enxergar no lean importantes ferramentas que contribuíriam para a construção de resultados positivos para a instituição. O time de Gestão de Provas não passou apenas por um processo de aprendizagem da metodologia lean, mas, por uma transformação, por uma mudança cultural na condução dos problemas e, o resultado não poderia ser diferente.

Em apenas um semestre os resultados positivos começaram a aparecer tanto na parte financeira, com a redução de custo e desperdício, quanto em outros aspectos, como o engajamento da equipe, maturidade dos processos, integração das áreas, construção e acompanhamento de indicadores; enfim, iniciava-se aqui uma gestão pautada no data driven.

Mas afinal o que mudou? Por que o projeto não teve sucesso na primeira vez, mas teve ganhos substanciais na segunda? Que lições e aprendizados eles puderam tirar dos fracassados esforços da primeira vez para fazer com que a segunda tentativa desse certo? A resposta não é simples, mas vamos explorar algumas mudanças de visão e atitude pelas quais a equipe envolvida nesses esforços precisou passar para continuar sua jornada lean.

Pensamento A3

Um dos maiores desafios da equipe de gestão de provas foi o entendimento e a construção de um A3, um paradoxo, visto que exatamente essa ferramenta foi a responsável pelo encantamento pela metodologia lean, mas, apreciar um A3 já em fase final e construir o seu seu próprio A3 são situações bem diferentes. Num primeiro momento a metodologia se demonstrou muito complicada e nada parecia dar certo. Não é para menos que a equipe chegou a fazer onze versões de um A3 para finalmente chegar na versão final.

O que a equipe percebeu após fazer alguns A3, entretanto, é que a maior dificuldade não estava no processo em si, mas, principalmente, na construção da informação para apresentação dos resultados. A construção de um A3 exige dados, algo que não existia na época tampouco a facilidade para coletá-los. Contudo, esse exercício para atingir o objetivo final e consolidar a versão do A3 fez com que o time de Gestão de Provas refletisse sobre dados básicos que precisavam ser construídos e acompanhados periodicamente. Essa, inclusive, foi uma das maiores conquistas para a área: o A3 possibilitou o desenvolvimento de formas para coleta de dados e criação de indicadores.

Hoje a equipe leva entre dez a quinze dias para finalizar um A3, pois já entendem a lógica, a dinâmica e a metodologia dessa ferramenta e já possuem dados e/ou formas de obtê-los; mais que a técnica a equipe vem amadurecendo o pensamento A3 nas atividades do seu dia a dia. Vale destacar que esse processo demanda alinhamento e integração com outras áreas e, portanto, exige um planejamento prévio para que seja possível a efetividade do processo e sucesso do projeto.

Figura 1: Versão 1 – A3 – Gestão de Provas

Figura 2: Versão Final – A3 – Gestão de Provas

Gerenciamento diário e gestão a vista

O gerenciamento diário e a gestão a vista estão entre as ferramentas mais conhecidas no lean, o que se justifica pela quantidade de benefícios que elas trazem para a gestão e o acompanhamento dos processos.

Ao longo da jornada lean para o time de Gestão de Provas um dos objetivos principais era consolidar um fluxo de gerenciamento diário atrelado à Gestão a vista. A primeira tentativa, no entanto, foi um fracasso: o time deparou-se com a dificuldade de compilar um grande volume de atividades e eventos de provas em um único espaço, mais, estático e visual, além de demandar um grande esforço manual da equipe para escrever cada tarefa. Houve, também, uma rejeição inicial pelo sentimento de exposição das entregas individuais do time, pois todos podiam visualizar quando estavam atrasados com suas tarefas diárias.

O desafio então era pensar em uma forma de conseguir administrar em torno de 800 eventos, com 35 atividades em média evitando atrasos e garantido o cronograma das provas.

 

Após vários dias de reflexão e discussões sobre os desafios encontrados o time de Gestão de Provas decidiu pelo desenvolvimento de uma planilha em Excel contemplando todo o planejamento de provas do semestre de modo que cada colaborador tivesse a visão de suas entregas e pudessem se programar para cumpri-las.  

Para o GD optou-se pelo agrupamento dos eventos por tipo e por escola, reduzindo, assim, o número de informações a serem preenchidas e acompanhadas diariamente.

Figura 3: Primeiro Painel Gerenciamento diário – Gestão de Provas

Figura 4: GD Gestão de Provas

Essas duas modificações resultaram numa aceitação do time e maior engajamento no projeto.

Kaizen

O kaizen é uma importante ferramenta que auxilia as equipes na busca por melhorias contínuas. Um possível caminho para mapear as melhorias a serem implementadas é identificar as fragilidades do setor. Acreditando nessa premissa o time de Gestão de Provas incluiu no GD um acompanhamento dos erros de processo sinalizando em vermelho os eventos e as IES que tiveram problemas, além da categorização e impacto desses erros para os alunos e para todos envolvidos no processo.

Esse acompanhamento diário possibilitou a implementação de kaizens (ações de melhoria) ainda no semestre em andamento o que inclusive proporcionou ao time a premiação em terceiro lugar no evento Kaizen Day promovido pelo grupo Anima. Um importante reconhecimento e motivação para que o time se engajasse ainda mais em sua jornada lean.

Figura 5: Premiação Gestão de Provas Kaizen Day

Nesse percurso, o time de Gestão de Provas percebeu que esses projetos precisam ser de responsabilidades dos integrantes do time, e que cada responsável deve acionar, quando necessário, as áreas e/ou os colaboradores de outras equipes para a entrega final do projeto, pois essa pessoa vive o trabalho e sabe o que é mais importante para que o kaizen tenha sucesso.

Caminhadas pelo gemba

O lean coloca muita ênfase em visitar e caminhar pelo gemba, local onde o trabalho acontece. Por isso, a equipe de Gestão de Provas do grupo Anima hoje faz visitas ao gemba, nesse caso, nas escolas, em dois diferentes formatos:

  1. Acompanhamento dos eventos de prova juntamente com os times de operação das IES no dia “D” (dia que o evento acontece). Esse acompanhamento traz diferentes reflexões para o time possibilitando verificar o resultado do trabalho pré-prova realizado e o impacto do mesmo nas IES, permitindo, assim identificar possibilidades de melhoria.
  2. Workshops percorrendo todas as escolas com dinâmicas, identificando problemas, percebendo o que dá certo e o que não dá e coletando informações sobre as expectativas da escola.

Figura 6: Dinâmica em grupo

Uma importante percepção do time de Gestão de Provas nesses encontros foi de que a IES não desejavam nada muito inovador ou disruptivo, desejavam apenas que o processo funcione.

Mindset

Não é novidade que o pensamento lean foca em resolver os problemas na causa raiz. Essa foi uma lição que o time de Gestão de Provas aprendeu ao longo de sua jornada lean, ou seja, é necessário mudar o mindset deixando de apagar incêndios e tratando dos sintomas em detrimento da causa raiz. Dessa forma, é possível buscar melhorias contínuas e não incorrer nos mesmos erros. O que permitiu essa mudança do mindset  no time de Gestão de Provas foi o amadurecimento da metodologia a partir da implementação e da aplicação das ferramentas lean em suas atividades diárias. O lean passa a ser compreendido pelo time de Gestão de Provas como a metodologia que instrumentaliza as atividades cotidianas em busca do sucesso dos projetos.

Engajamento

A maior dificuldade de uma implementação lean é trazer a equipe a bordo. Não adianta você querer implementar o lean se sua equipe não estiver disposta a fazer o mesmo. E não é fácil engajar as pessoas.

O livro “Liderar com Respeito”, de Michael e Freddy Ballé, foi indicado à liderança do Gestão de Provas para servir como inspiração para as mudanças relacionadas ao engajamento do time no projeto. Contudo, num primeiro momento a mudança conduzida na história parecia uma transformação muito brusca e distante da realidade do time. Aquela experiência ora relatada no livro se demonstrou desafiadora para a liderança do Gestão de Provas em transpor os relatos lidos em ações reais para a transformação do time em sua jornada lean.

Aos poucos a liderança percebeu que a inteligência coletiva é que promoveria essa mudança e, portanto, o caminho não poderia ser diferente senão compartilhar e construir os projetos em conjunto, com toda a equipe envolvida e unida, mostrando a importância do lean e demonstrando respeito por cada pessoa; eventualmente todas subirão a bordo. Entretanto, isso não acontece da noite para o dia. Em um primeiro momento, haverá resistência. É natural. O que precisamos fazer é saber lidar com essa resistência.

Como podemos perceber pela jornada apresentada do Gestão de Provas, a caminhada lean é difícil, mas ela vale a pena. Para que consigamos fazer o mesmo e superar uma tentativa fracassada de implementação lean, precisamos aprender a assumir nossos erros, algo que as pessoas não estão acostumadas a fazer, e a criar maturidade. A implementação lean sempre é dolorosa, pois primeiro precisamos aceitar que temos problemas e que erramos constantemente, mas, se conseguirmos aceitar isso, no final, quando os resultados aparecerem, tudo fará sentido, e isso lhe dará forças para melhorar cada vez mais, de forma contínua.

Publicado em 31/01/2019

Autores

Robson Gouveia
Diretor no Lean Institute Brasil.
Gislene Garcia
Gerente de serviços ligada à diretoria de Processos e Serviços ao aluno da Anima
Planet Lean - The Lean Global Networdk Journal