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Modelo de gestão precisa ser "popular"

Flávio Augusto Picchi
Modelo de gestão precisa ser "popular"
A competência em traduzir didaticamente e em linguagem simples os novos conceitos e práticas é uma das coisas mais importantes num processo de transformação

O que é uma coisa popular? Podemos dizer que é algo que caiu no gosto do povo. Alguma coisa que uma grande parcela das pessoas usa, quer consumir ou, no mínimo, fala muito sobre aquilo.

E o que faz algo se tornar realmente popular? Ainda é um mistério, mas uma coisa, no entanto, é quase óbvia nesse tipo de fenômeno. A primeira qualidade para que algo se torne realmente popular é que ele precisa ser de fácil entendimento. Deve ser compreendido por muita gente, se possível de imediato. Esse é provavelmente o primeiro passo.

Em gestão, isso também faz sentido. É que um modelo de gestão só será colocado em prática se as pessoas de fato se envolverem com ele no dia a dia. Para isso, elas precisam entender os conceitos e as práticas. Nesse sentido, um modelo de gestão de sucesso também precisa ser “popular”.

Nesse contexto, um dos grandes defeitos das empresas é utilizar linguagens, expressões ou conceitos colocados de forma hermética, por demais complexa, que só podem ser entendidos e, portanto, utilizado por “iniciados”, por especialistas. Quanto mais difícil for esse entendimento, mais demorada e trabalhosa será a implementação, o uso prático e cotidiano das práticas e técnicas necessárias.

O sistema lean se manifesta de forma concreta também por meio de uma série de conceitos e práticas que precisam ser comunicados, entendidos e adotados. Sendo uma filosofia de gestão que vai da estratégia até a operação, precisa “falar a língua” das pessoas, para que elas entendam e pratiquem, principalmente aquelas que estão colocando a mão na massa, como se diz.

Claro que esse processo não pode ser confundido com o ato de simplificar, superficializar ou mesmo vulgarizar os conceitos e práticas, no sentido de empobrecê-las, mas, sim, comunicando de uma forma que possam ser facilmente compreendidas por todos; e, ao mesmo tempo, mantendo a profundidade e a disciplina.

Diversas estratégias podem ser adotadas para se conseguir esse objetivo. A primeira, muito eficaz, é traduzir conceitos fundamentais numa linguagem simples e, se possível, lúdica, que todos possam entender, memorizar e utilizar disciplinadamente. Por exemplo, diversas organizações utilizam lean days, gincanas, competições, gibis e toda forma de comunicação e envolvimento para explicar com simulações e exemplos do cotidiano como utilizar conceitos lean na prática.

Quando temos sucesso em conectar a comunicação do sistema de gestão com as pessoas, eles se apropriam dos termos. Em uma empresa que visitei, os operadores incorporaram o conceito de kaizen (palavra japonesa para melhoria sistematizada com participação da equipe) de tal forma que sempre que identificavam um problema, já chamavam os colegas, dizendo: precisamos fazer um “lean” aqui.

Termos estrangeiros, em inglês ou japonês (e na aplicação do lean usamos vários), não são o ideal, mas quando são compreendidos, passam a ter as pronúncias locais. O mais importante é que todos entendam e apliquem. É divertido e realizador ver quando as pessoas da linha de frente nos relatam que estão aplicando o lean em suas atividades domésticas – como o uso do kanban (sistema puxado de reposição, conforme consumo) para gerenciar a comida de seu animal de estimação.

Ter essa consciência é importante. Portanto, pense nisso quando sentir alguma dificuldade na mudança de um modelo de gestão. A competência em traduzir didaticamente e em linguagem simples os novos conceitos e práticas é uma das coisas mais importantes num processo de transformação.

Publicado em 04/10/2023

Autor

Flávio Augusto Picchi
Senior Advisor do Lean Institute Brasil