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Processos precisam incorporar o “poka-yoke” para serem à prova de erros

Flávio Augusto Picchi
Processos precisam incorporar o “poka-yoke” para serem à prova de erros
Uma cultura disseminada na empresa toda de buscar, prevenir e minimizar fontes de possíveis erros, evitando que cheguem até os clientes, pode reduzir prejuízos maiores, seja para reconquistar o consumidor, seja para corrigir as falhas que ocorram

Não é de hoje que consumidores reclamam, aos montes, sobre erros de empresas na internet. No entanto, a impressão é que isso vem aumentando cada vez mais.

O “Procômetro”, por exemplo, indicador do Procon-SP que soma os valores relacionados a reclamações de clientes, registrou, só no ano passado, cerca de R$ 1,8 bilhão em reclamações. E já em maio deste ano, o montante de 2023 já tinha ultrapassado R$ 1,5 bilhão, o que indica que teremos, em breve, um recorde.

Isso acaba se tornando um calcanhar de Aquiles para muitas companhias, cujos desgastes provocados pelo excesso de reclamações são, por vezes, incontornáveis.

Claro que os erros das organizações ocorrem por motivos variados. Muitas empresas tendem a responsabilizar os funcionários pela maioria das falhas que vão gerar problemas detectados pelos clientes. Buscam sempre explicação em alguma desatenção ou por não seguirem detalhes que o processo exigia.

No sistema lean ou enxuto, a postura é inversa: claro que as pessoas precisam desempenhar suas tarefas da melhor forma possível, mas, antes de mais nada, os processos precisam ser desenhados para prevenir ao máximo a possibilidade de ocorrência de falhas.

No sistema lean, chamamos isso de “poka-yoke”, expressão japonesa que pode ser traduzida como “à prova de erros”. São sistemas que dificultam ou mesmo impedem totalmente que um erro aconteça.

Nas empresas, essa ideia surgiu na Toyota, embrião do sistema lean. Desde então, vem se difundido nas fábricas e nos escritórios. Por exemplo, quando se cria um dispositivo que só permite que um produto siga na linha de produção se todos os parafusos estiverem devidamente apertados. Ou um sistema digital, no qual não se consegue ir para a próxima tela se não forem inseridos todos os dados necessários.

Se bem pensados e aplicados ao longo dos pontos críticos dos processos, os dispositivos poka-yokes não deixam que falhas ocorram ou passem despercebidas. Na verdade, o conceito de poka-yoke pode e deve ir além de sistemas atuando em pontos específicos. Sua aplicação pode ser ampliada, no sentido de uma cultura de busca incessante, por parte de todos, de possíveis riscos ou vulnerabilidades, visando tornar todas as atividades da empresa à prova de erro.

Por exemplo, desenvolvendo processos simples. Quanto mais complexo é um processo, com muitas idas e vindas, mais chances ele terá de possibilitar falhas. A simplicidade, transparência e clareza sobre como executar as atividades tendem a deixar mais aparente as possibilidades de erros, o que é o primeiro passo para evitá-los. Os processos já devem nascer à prova de erros desde suas concepções.

Outro ponto importante é planejar os processos junto com as pessoas que estão no gemba – no local onde tudo é produzido – e serão as responsáveis por eles, de uma ponta a outra. São essas pessoas que têm conhecimentos profundos sobre como as atividades são realizadas. Elas certamente saberão onde estão os riscos e poderão ajudar a eliminá-los ainda na fonte.

Outro fator importante é testar cada operação para validá-la. Ou seja, simular o processo de maneira mais fiel e exata possível ao que ocorrerá quando tudo for implementado de verdade. Experimentar e vivenciar exaustivamente, para checar a qualidade. Ou seja, executar todo o processo num ambiente controlado, colocando-se no lugar do cliente, observando a criação de valor, o que funciona e o que pode ser melhorado. E estressar o processo de todas as maneiras, antecipando variações extremas que possam ocorrer.

E, também, manter permanentemente o foco de todos no sentido de analisar: o que pode dar errado? Quais as consequências? Como prevenir? São questões corriqueiras nas análises de engenharia sobre possíveis modos de falha, mas que devem ser estendidas e praticadas de diferentes formas por todos no dia a dia.

Uma cultura disseminada na empresa toda de buscar, prevenir e minimizar fontes de possíveis erros, evitando que cheguem até os clientes, pode reduzir prejuízos maiores, seja para reconquistar o consumidor, seja para corrigir as falhas que ocorram. Fazer certo da primeira vez é sempre melhor do que consertar os erros. Vai poupar insatisfações e manter a reputação da organização cada dia mais forte.

Publicado em 25/05/2023

Autor

Flávio Augusto Picchi
Senior Advisor do Lean Institute Brasil