Embora muitas vezes deixada de lado nas transformações lean, a
área de compras oferece uma excelente oportunidade de crescimento para as empresas quando o
foco dos esforços enxutos também se concentram nela. Em nossa experiência, vimos
como o foco nas compras lean já rendeu a diversas empresas ganhos significativos de
produtividade, um maior foco estratégico, melhorias no processo de desenvolvimento de
pessoas, reduções de custo em até 15% (podendo ultrapassar essa porcentagem
dependendo do caso), dentre outros ganhos.
Redução de custos OBTIDA — OPEX de 3 a 15%,
CAPEX de 10 a 25% e outros ganhos
O problema é que muitas vezes esses ganhos não são conquistados, pois por
vários anos e por várias razões, a área de compras sempre foi
considerada como mera área de back-office ou simplesmente um apêndice
administrativo/burocrático. Por outro lado, organizações que têm se
dedicado à busca pela excelência operacional em todos os aspectos, principalmente com
forte foco na filosofia enxuta / mentalidade lean, têm percebido que a área de compras,
na visão mais ampla do supply chain completo (end-to-end), tem papel
fundamental e crucial. Nesse sentido, ela faz parte do primeiro elo na cadeia de
agregação de valor, ou seja, são as primeiras entradas no sistema integrado da
gestão empresarial, tais como matérias primas, componentes, insumos, serviços
etc. Dessa forma, muitas empresas lean perceberam que precisam tratá-la com o devido cuidado
e respeito, assumindo uma responsabilidade sócio-ambiental e buscando sempre
relações sustentáveis.
Com base nesses aspectos e com todo o potencial citado acima, a questão que fica na
cabeça das pessoas é “como aplicar o lean em compras?”. Bem, sugerimos um
modelo que cunhamos de “Inteligência de Compras em uma Organização
Lean ”, configurada através de um estilo mandala.
A mandala da Inteligência de Compras em uma Organização Lean
Levando-se em conta os tópicos acima mencionados, configuramos um modelo de
aplicação lean à área de compras com o intuito de buscar a
excelência em uma empresa lean. Dentro de um enfoque estilo “mandala”, essa
abordagem está ramificada em três dimensões, o eixo estratégico, o eixo
otimizado e o eixo inovativo.
Área de compras estratégica
Compras como parte da excelência operacional:
Tratar compras como parte da excelência operacional é o principal norteador da mandala.
Dessa maneira, a função de compras pode ir além da mera redução
de preços. Pode agregar valor ao impulsionar a inovação e
otimização/redução de custos e fortalecimento de parcerias no longo
prazo.
Enfoque de segmentação por categorias de produtos/serviços:
Esse eixo tem por finalidade buscar a segmentação por categorias de produtos,
serviços e fornecedores. A partir desse ponto, torna-se mais fácil entender como
parametrizar esses aspectos via análises de mercado e seus respectivos impactos e
benefícios para a organização.
Para isso, é necessário buscar parcerias mais sustentáveis para ambas as partes
envolvidas, visando ao longo prazo, e a contratos com regras confiáveis com
relações positivas para a empresa e para o fornecedor. O foco que precisamos buscar
deve estar sempre na qualidade na fonte sobre produtos e serviços comprados e no aumento de
competitividade para os dois lados.
Adicionalmente e sempre que for factível, a visão deve estar centrada no TCO (Total
Cost Ownership), e não somente no preço na base, sem levar em
consideração todas as variáveis do custo total (eficiência
energética, custos logísticos na origem e no destino, produtividade, custo de
peças de reparos etc.). Assim, pode-se criar as condições necessárias
para forçar targets realistas e trazer mais competitividade sobre as frentes de
fornecedores (esse aspecto evita compras simplistas, ou seja, evita-se a comparação de
preço base contra preço base).
Fornecedor como parceiro de negócios:
O que muitas vezes fica evidente nas transformações lean que presenciamos é que
quando se pensa em nivelar o sistema como um todo a fim de evitar o efeito chicote nos processos
produtivos internos, nivelar a cadeia de fornecedores é fator-chave para a busca de um
sistema puxado e balanceado em toda a cadeia (produção, logística,
finanças etc.), integrando ao sistema de compras, então, uma logística
just-in-time.
Numa empresa em que se considera o processo de compras lean, sempre se busca a credibilidade na
parceria, com transparência e relações respeitáveis. Todavia, não
se pode confundir isso com um processo paternalista, uma vez que são criadas
condições de negociação através de targets e objetivos
agressivos com um forte enfoque na eliminação daquilo que não agrega valor no
aspecto custo. Ao mesmo tempo, nunca se ataca a margem de lucratividade do parceiro, protegendo ao
mesmo tempo o fornecedor e o fornecimento.
Um exemplo lean: A relação da Toyota com seus
fornecedores
Área de compras otimizada
É muito comum ver esforços de transformações nas compras pularem
diretamente do nível estratégico para o nível de inovações.
Contudo, é importante sempre e antes de se falar em inovação com vistas ao
mundo externo, buscar as melhorias nos processos internos/suporte da área, tais como o
mapeamento dos fluxos de cadastro dos produtos/serviços comprados via projetos de lean
office (matérias-primas, insumos etc.). Assim, busca-se torná-los mais
enxutos e eliminar tudo o que não agrega valor neles (por exemplo, cadastros em desuso,
errados, genéricos, com redundância de informações etc.). O objetivo
principal aqui é de se fazer sempre um bom processo de compras estratégico, com base
em dados enxutos, sejam eles processuais ou de redução da base de fornecedores. A
ferramenta lean de mapeamento de fluxo de valor pode e deve ser usada sempre que se deseja procurar
por desperdícios e problemas nos processos, a fim de torná-los mais enxutos e mais
agregadores de valor do ponto de vista do cliente. Somente após essa etapa de
aplicação da ferramenta lean, conseguimos usar tecnologia nos processos; caso
contrário, os desperdícios são automatizados, levando à
frustração de grandes projetos envolvendo a transformação digital de
compras.
Área de compras inovativa
Assim como a indústria, a área de compras está vivendo um momento de
migração para o mundo virtual. Com seu futuro em jogo, vemos uma forte iniciativa para
a evolução que chamamos de “Compras Digitais/Compras 4.0”. Assim, é
de fundamental importância que de agora em diante se busque cada vez mais os processos
virtuais, tais como a inteligência de mercado (que mostra a evolução de
preços de commodities com link direto aos big datas e IA nas bases
dos fornecedores, embargos e sanções via data lakes de
organizações internacionais e países etc.).
Atualmente, mais de 50% dos produtos desenvolvidos possuem tecnologias oriundas das bases de
fornecedores, o que chamamos de inovação portas abertas. Aqui também a parceria
de longo prazo e com credibilidade é de fundamental importância para a sustentabilidade
dos contratos e ERPs conectados entre as empresas, com IA entre as interfaces.
Lean como base para a transformação:
Tudo neste artigo está conectado a um bom e bem estruturado sistema de gestão de
pessoas, com formações específicas e generalistas para todos os níveis
da cadeia hierárquica de compras. Dessa maneira, é possível sempre agregar
valor contínua e dinamicamente, tendo em vista as mudanças tecnológicas que
estão ocorrendo / irão ocorrer cada vez mais fortes; ao mesmo tempo, torna-se
possível também manter o nível de motivação das pessoas na
área. Tornar compras uma parte da excelência operacional é o passo fundamental
na transformação / gestão da área. Partindo-se desse princípio, o
pensamento lean é certamente o divisor de águas para o novo modelo de gestão.
Portanto, comece o quanto antes esta transformação através do pensamento lean em
compras, a fim de agregar mais valor com essa visão disruptiva.