GERAL

Quatro Tipos de Problemas... um Sistema de Gestão

Gustavo Adolfo Gomez Pineda
Um sistema de gestão lean é necessário para efetivamente administrar um negócio. Os quatro tipos de problemas de Art Smalley podem ajudar tal sistema a focar no que realmente importa?

Venho estudando e praticando o pensamento lean pelos últimos 20 anos, principalmente aprendendo na prática — on the job — e usando nossa planta como um laboratório. Nossa vontade de sempre fazer experimentos nos levou, em setembro de 2019, a tentar implementar as ideias contidas no livro “Quatro Tipos de Problemas”, de Art Smalley. O livro tinha acabado de ser traduzido para espanhol e, ao ler, fiquei imediatamente impressionado. 

Decidimos determinar se o sistema de gestão lean que tínhamos em nossa planta era compatível com a categorização de problemas de Art. Começamos com um workshop que co-organizamos com o Lean Institute Colombia. As (muitas) questões que apareceram foram realmente nosso ponto de partida neste experimento. 

Os quatros tipos de problemas que Art Smalley descreve em seu livro pareciam muito interessantes para nós, mas tivemos dificuldades para casá-los com nossas práticas de gestão a princípio. Havia claramente alguns pontos em comum, mas, no geral, achamos difícil reconhecer os diferentes tipos de problemas em nosso contexto. Mal sabíamos que a categorização de Art logo viraria nosso sistema de gestão de cabeça para baixo! 

Sem saber ao certo como abordar esse experimento, decidimos olhar para os quatro tipos de problemas no contexto da casa lean, fazendo uma conexão às nossas práticas lean (desde os padrões até kata e balanced scorecard) mais explícitas. Dessa forma, fomos capazes de criar um modelo interessante que integramos em nossa revisão semanal da gestão. 

Não demorou muito para que as paredes de nossa obeya (onde nossa revisão da gestão acontece) refletisse a mudança que estávamos esperando criar com nosso experimento. Ao reajustar os nossos quadros nas paredes para refletir os quatro tipos de problemas, mudamos a forma como conversávamos sobre os problemas na planta. 

A estrutura da reunião 

Nossas reuniões semanais da gestão sempre começam pelo cliente. Garantimos que eles estejam satisfeitos e analisamos quaisquer reclamações que recebemos. Depois, começamos a olhar para os diferentes tipos de problemas: 

  • Primeiro, analisamos os problemas do tipo 1 — condições anormais que são retificadas através da contenção rápida — que estão “abertas” há mais de cinco dias. Olhamos um problema por vez para realmente garantir que não estamos perdendo nada. 
  • Depois, seguimos com os problemas abertos do tipo 2 — verdadeiros gaps do padrão que requerem uma solução de problemas mais estruturada — e vemos se precisamos escalar algum problema do tipo 1 para o tipo 2. Lidamos com problemas do tipo 2 utilizando A3 dedicados. Nesse ponto da reunião, usamos o balanced scorecard (uma ferramenta com a qual estamos muito familiarizados) para avaliar como estamos nos saindo em relação às nossa metas. Estabelecemos um prazo de 30 dias para resolver os problemas do tipo 2. Se não conseguirmos fazer dentro de um mês, sabemos na hora que precisamos analisá-los mais profundamente. 
  • Para problemas do tipo 3  — aqueles que se referem à nossa situação-alvo, as perguntas estratégicas que precisamos responder para melhorar nosso desempenho —, olhamos para nosso plano hoshin. Também tentamos “antecipar” quaisquer riscos em potencial que podemos enfrentar na fábrica nos próximos três meses usando a “proposta A3”. 
  • Para nós, os problemas do tipo 4 — aqueles relacionados à inovação — estão conectados à nossa transformação digital, que também está integrada ao nosso hoshin. Em particular, temos três iniciativas digitais que consideramos muito importantes para nós estrategicamente. 

Em sua forma atual, a reunião dura cerca de duas horas. Descobrimos que uma reunião semanal de duas horas é mais efetiva do que uma mensal de oito horas: ela permite que nos aprofundemos ao mesmo tempo em que facilita a preparação dos gerentes. 

Mudando a forma como gerenciamos

Embora nós, pensadores lean, enxerguemos os problemas como oportunidade, não podemos esperar que esse seja o caso para todas as pessoas de nossas organizações. Na verdade, é frequentemente difícil falar sobre os problemas. E mesmo quando eles são abertamente discutidos, as pessoas acham difícil fazer isso de uma forma estruturada. Inicialmente, na Schneider Electric, encontramos certa resistência na equipe: eles não enxergavam a conexão entre os quatro tipos de problemas e o trabalho deles. Mesmo assim perseveramos, sabendo que não poderíamos olhar para os quatro tipos de problemas de forma isolada: eles tinham que estar embutidos em nossa abordagem, do MFV ao hoshin. A mudança para o sistema de quatro tipos de problemas foi difícil, mas as pessoas já conseguiram interiorizá-lo. Agora é uma rotina para elas, uma parte de seu DNA. Isso nos forneceu uma linguagem comum, assim como o A3 e o MFV haviam feito no passado. 

Quando olho ao redor, vejo muitas empresas que não são capazes de identificar quais problemas são prioridade, e isso acontece porque elas não consegue distinguir entre os diferentes tipos de desafios que eles enfrentam. Por exemplo, existe uma tendência clara no mundo dos negócios de tratar os problemas do tipo 1 e do tipo 2 como se fossem do tipo 3 ou do tipo 4 (por exemplo, implementando um aplicativo para contornar o problema em vez de verdadeiramente entendê-lo e consertá-lo no gemba). O que é ainda pior é que muitas empresas só focam nos problemas do tipo 1 e do tipo 2, esquecendo dos críticos tipo 3 e tipo 4. Isso também aconteceu comigo, mas acho importante fugir disso — algo que a metodologia de Art o força a fazer. 

Tem sido incrível ver como os quatro tipos de problemas transformaram a maneira como gerenciamos nossa fábrica, complementando perfeitamente o sistema lean de gestão que construímos ao longo dos anos. A maior contribuição dessa nova abordagem foi nos ensinar a importância de tentar prever os problemas (proativamente) em vez de simplesmente responder quando eles ocorrem (reativamente). Encontrei muito valor ao começar a olhar para os problemas dos tipos 3 e 4, embora eu tenha que admitir que os problemas dos tipos 1 e 2 frequentemente ocupam todo o tempo que temos disponível. 

A beleza dessa abordagem é que, ao focar consistentemente naqueles pontos de dor do tipo 2, você está gradualmente construindo uma operação mais suave, que, por sua vez, lhe dará mais tempo para focar em problemas mais estratégicos. Na Schneider Electric Colombia, estamos enxergamos coisas que não enxergávamos antes e estamos atacando problemas de uma forma mais efetiva, enquanto antes frequentemente confundíamos as coisas e não implementávamos a resposta certa para nossos problemas. Não há dúvidas de que agora estamos olhando para nosso trabalho de uma forma mais completa, usando uma estrutura mais lógica para nosso trabalho enquanto gerentes. Estamos mais confiantes em nossa habilidade de enfrentar qualquer desafio que apareça. 

Vimos até um pequeno aumento na produtividade nos últimos nove meses. Tendo reduzido o número de problemas do tipo 1 que enfrentamos, as pessoas podem agora contribuir mais para a melhoria da planta. Na verdade, a maioria dos problemas que temos agora vem de fora — por exemplo, um fornecedor que não envia as peças devido à pandemia. 

Isso pode ajudar as empresas após a Covid? 

Quaisquer que fossem seus planos hoshin para 2020, você provavelmente teve que revisar o quadro. Acredito este seja o tempo perfeito para integrar os quatro tipos de problemas em suas atividades, pois em uma crise tendemos a focar nos problemas dos tipos 1 e 2 a todo o tempo. Mas o fato do presente momento turbulento não deveria nos fazer esquecer do nosso futuro. Somente o apagar de incêndios não é suficiente para tirar-nos da crise. 

Os problemas dos tipos 3 e 4 tem a ver com conseguir melhores níveis de serviço e se reinventar, respectivamente. As duas coisas são agora mais cruciais do que nunca. Frente à Covid-19, muitas organizações parecem paralisadas, incapazes de  agir (tomar qualquer ação). Mas é precisamente quando as coisas ficam difíceis que você precisa tentar coisas novas, fazer ainda mais experimentos do que antes. 

O gerente moderno tem que trabalhar com os quatro tipos de problemas na mente. 

Um comentário de Art Smalley

Fico feliz em escutar as reflexões da empresa sobre suas experiência com os quatro tipos de problemas. A maioria das organizações têm dificuldades com as melhorias, e habilidade de resolver problemas é fundamental em todos os casos. 

Os iniciantes normalmente preferem ver as coisas de uma forma e focar nesse ponto de vista cedo em seu desenvolvimento. Quanto mais avançado você se torna em seu campo, mais você aprende a ver as coisas por diferentes ângulos ou perspectivas. 

Os problemas podem às vezes ser resolvidos rapidamente através de ações, treinamento e cooperação. Às vezes, problemas mais difíceis requerem expertise no assunto e níveis técnicos mais profundos de análise. Em alguns exemplos, não existe nenhum problema propriamente dito, mas ainda há desperdício e muitos ângulos para melhoria. 

Ocasionalmente, insights incríveis ocorrem, e possibilidades inteiramente novas aparecem. Até mesmo cientistas especializados às vezes têm que fazer contenção devido a algum tipo de limitação de tempo ou recurso. Por outro lado, os iniciantes podem às vezes enxergar possibilidades que um observador veterano pode perder. 

Os problemas são uma oportunidade para melhorar e desenvolver nosso potencial humano. O contexto para solução de problemas é vital e nunca um conceito estático. Em sua respectiva linha de trabalho, por favor, pense sobre que tipo de problema você está enfrentando e na melhor forma de endereçá-lo de acordo com as circunstâncias. Para cada problema há uma mistura diferente de limitações de tempo e recursos, níveis de dificuldades, impacto ou oportunidade, capacidade e risco associado. Fico feliz quando vejo as empresa organizando suas abordagens de acordo. 

Para mais insights, leia o livro de Art “Quatro Tipos de Problemas”.

Publicado em 14/07/2020

Autor

Gustavo Adolfo Gomez Pineda
Gerente de Planta na Schneider Electric Colombia e Senior Advisor no Lean Instituto Colombia.
Planet Lean - The Lean Global Networdk Journal