A sabedoria popular nos diz que jamais devemos colocar todos os ovos num mesmo cesto. Se o cesto cair, todos os ovos se quebrarão e ficaremos sem nenhum. Se separarmos os ovos, colocando-os em cestos distintos, a queda de um deles não porá fim a todos os ovos. Ainda nos restariam aqueles que estivessem nos outros cestos.
Então, empresas que não queiram ver suas operações comprometidas devem contar com mais de um fornecedor para cada componente de que precisem. Agindo assim, "não colocariam todos os ovos num mesmo cesto". Se um fornecedor falhar, o abastecimento não ficaria comprometido. Além do mais, a cada compra seria possível cotar preços para depois decidir de quem comprar. Certo? Errado. Principalmente quando se pretende operar um sistema enxuto.
O princípio de diversificação do risco, em alguns casos, pode fazer sentido. O risco, no caso dos ovos, ficaria por conta da possibilidade indesejada de não se comer nenhum, caso o único cesto em que estivessem todos se estatelasse no chão. Mas, e se houvesse a garantia de que o cesto jamais cairia de nossas mãos? Não seria mais necessário andarmos com dois ou mais cestos. Bastaria um. Firme. Estariam garantidos os ovos.
O funcionamento adequado de sistemas enxutos só é possível quando existe cooperação entre empresas de uma mesma cadeia de valor. E cooperação só é factível quando existe confiança na relação ente elas. Prenda o cesto à mão. Estabeleça uma relação de confiança com seus fornecedores. Não procure eliminar o risco aumentando o número de possíveis fornecedores. Selecione os melhores e "amarre-se" a eles.
O estabelecimento de uma relação diferenciada, que tenha em suas bases a cooperação e a confiança como princípios centrais é necessária por diversos motivos. Vejamos os principais. Vale lembrar que o presente artigo não procura exaurir o tema e que os motivos aqui apresentados possuem uma relação umbilical entre si, não podendo ser compreendidos de forma isolada.
Será que para todo e qualquer tipo de insumo seria necessária uma parceria nesses moldes? É claro que não. Em alguns casos é possível proceder da maneira tradicional de se comprar, desde que as ofertas dos diferentes fornecedores sejam satisfatoriamente substituíveis entre si e que haja tempo para realizar a cotação, analisar preços e prazos para só então fechar negócio. É o caso de suprimentos de importância secundária, que, se vierem a faltar, não colocarão em risco as operações que criam valor para a empresa e para os clientes.
Por exemplo, uma indústria de móveis que operasse de forma enxuta haveria de estabelecer uma parceria estratégica com seu fornecedor de materiais de escritório? É óbvio que não. Mas estaria correndo sérios riscos se não se aproximasse de quem lhe fornecesse madeira. A diferença que existe entre o grau de importância que cada insumo tem para o fluxo de valor de determinada empresa deve ser o fator central para se definir se deve ou não haver um relacionamento diferenciado entre ela e o fornecedor em questão.
Sistemas Lean têm como pilar fundamental a busca contínua pela redução do lead time total demandado para a conclusão do produto/serviço. Em outras palavras, o que se procura é reduzir o tempo compreendido entre a entrada dos insumos por uma porta e a saída de produtos/serviços acabados por outra. Para tanto, faz-se necessária a eliminação dos que permeiam os processos.
Não é por outro motivo que se procura reduzir os níveis de recursos empregados no sistema. Deixa-se de produzir em grandes lotes, seguindo uma programação baseada em previsões, e se passa a fazer em lotes reduzidos (idealmente unitários) seguindo o ritmo de consumo real, que "puxa" as operações precedentes.
E é exatamente em função dessa mudança na forma como se concebe as operações que se faz necessário desenvolver uma política de relacionamento baseada na confiança com fornecedores de insumos estratégicos.
Sistemas enxutos requerem entregas mais freqüentes e em menores lotes, o que só se sustenta se houver pontualidade por parte do fornecedor. Além do mais, se a qualidade do insumo for garantida, não será necessário inspecionar cada entrega, além de não haver atrasos com devoluções de itens defeituosos. Como é possível obter os insumos certos, na quantidade necessária, no momento correto e dentro das especificações requeridas, de forma consistente, sem que haja confiança em quem os está fornecendo? Será que todos os fornecedores estariam aptos a cumprir esses quesitos? Empresas enxutas buscam, além disso, ensinar seus fornecedores a produzir just-in-time e não somente entregar desta forma. Caso contrário, os estoques apenas mudarão de mãos e os desperdícios que permeiam a cadeia estendida continuarão existindo.
Outra dimensão importante diz respeito ao tempo despendido por processos de compra tradicionais. Detecta-se a necessidade interna, encaminha-se o pedido para o departamento de compras, cota-se os preços, analisa-se, negocia-se, decide-se e só então se compra. É tempo demais! Quando se tem uma relação mais próxima com fornecedores-chave, todo esse desperdício é eliminado. Precisa de determinado item, apenas envie um sinal a seu fornecedor informando a quantidade. Saberá de antemão o tempo que ele leva para receber. Estará ciente da qualidade dos produtos que receberá.
Cooperação também deve passar a ser palavra-chave no desenvolvimento de novos produtos e processos e no aperfeiçoamento dos já existentes. Com a participação ativa daqueles que serão os provedores dos suprimentos, uma enormidade de recursos pode ser poupada. Que tal envolver os fornecedores no início do processo de desenvolvimento? Mas, para que isso seja factível, transparência e confiança devem passar a ser palavras de ordem.
A consolidação dessa relação não é algo que acontece de uma hora para outra. São necessários esforços de ambas as partes. Para tanto, há de se agir de forma parcimoniosa na busca desses parceiros. Faz-se necessário assumir compromissos de longo prazo, onde o princípio de cooperarão mútua seja evidente. Dificuldades surgirão e só serão transpostas se houver engajamento de ambas as partes na resolução de problemas que aparentemente se mostrarão estar fora dos limites físicos de suas instalações. Os benefícios auferidos residirão nas possibilidade a serem abertas para a redução contínua de custos, para o aperfeiçoamento da qualidade dos produtos e para o aumento da eficácia dos processos.