RECURSOS HUMANOS

É possível criar um trabalho gratificante?

Autores: Ballé, M & Liker, J

Oferecendo-nos uma visão rápida de como a mente humana funciona na abordagem da Toyota sobre o comprometimento das pessoas, este artigo nos diz como criar um melhor ambiente de trabalho para os nossos colaboradores.


Por esses dias fomos inundados de artigos sobre a falta de pessoas engajadas no trabalho; ao mesmo tempo, estão surgindo evidências que um alto nível de engajamento hoje é mais importante para fazer um colaborador satisfeito com o seu trabalho do que o salário.

Certamente, de acordo com o Gallup, parece que o envolvimento dos colaboradores está em um nível mais baixo de todos os tempos, com apenas 30% dos colaboradores americanos tem se mostrado a dar o seu melhor desempenho. A situação parece ser pior em outros países industrializados. O Gallup calcula que o resultado da perda de produtividade para a economia dos EUA é um valor estimado entre $450 e $550 bilhões. Assombroso

Décadas atrás o psicólogo Frederick Herzberg, o pai do enriquecimento do trabalho, disse que o envolvimento entre o salário, status e ambiente físico pode ocasionar insatisfação se nós não sentirmos que estamos sendo tratados de forma justa ou se temos más condições de trabalho, ainda que dando-nos mais e mais recompensas extrínsecas não nos torna mais satisfeitos.

Os motivadores que nos mantem satisfeitos no trabalho, em vez disso, são inerentes no seu próprio trabalho – desafio, compromisso e senso de entusiasmo. Isso faz parecer que nós estamos redescobrindo aquela lição e que talvez a nova geração de colaboradores se preocupe com o trabalho gratificante mais que seus avós e seus pais tinham.

A chave para a satisfação do cliente é o colaborador satisfeito – este é o principio central do modelo Toyota, a metodologia de gerenciamento da Toyota, o qual temos estudado nos últimos 20 anos (bem como as tentativas de aplicar o “lean” fora da indústria automotiva). Na prática, afim de buscar um sorriso no cliente, você primeiro deve conseguir um sorriso nos colaboradores.Como? Colaboradores satisfeitos soam bastante como música militar ou administração da ciência – intelectualmente possível, mas uma contradição na prática.

Mas pode ser um inevitável efeito desses tempos de mudança, com cada vez mais pressões financeiras sobre os custos, cada vez mais corporações muito grandes para falir, e sistemas de TI onipresentes que definem o trabalho de longo prazo nos mínimos detalhes só para depois executar tão... bem, assim como um sistema de TI faz.

Baseado no nosso compromisso de longo prazo pesquisando a Toyota, nós podemos concluir que a empresa é certamente séria sobre o envolvimento dos colaboradores. Respeito com as pessoas tem sido um esteio deste modelo de negócios desde a primeira publicação que menciona isso em 1977,tem sido de valor fundamental na empresa por muito mais tempo. Ligando o destino da empresa com o compromisso dos indivíduos é sem dúvida o ideal da Toyota, mas faze-lo na pratica é realmente difícil. A Toyota não é uma empresa recém-criada de alta tecnologia agradável e veloz, mas, no contrário, o arquétipo da indústria global é o que isso implica em termos de burocracia, fábricas e hierarquias.

Então, como a empresa atinge esse nobre objetivo?

Praticamente, em vez de inventar um trabalho gratificante desde o início, a abordagem da Toyota é tentar tirar os aspectos menos agradáveis de cada trabalho através do desenvolvimento do que eles chamam de “confiança mútua”.

Isso significa, que primeiro, desenvolver a confiança dos colaboradores nas habilidades para fazer um bom trabalho, então sua confiança no seguinte fato – não importa quais dificuldades eles vão encontrar -eles serão tratados de forma justa pelo seu supervisor (e a empresa em geral), e finalmente a confiança na competência de seus diretores no fato de que eles se importam.

Na prática, isto significa trabalhar com cada colaborador de modo que 1) eles possam dizer imediatamente um trabalho bom a partir de um ruim da perspectiva do cliente(o passo seguinte no processo), 2) eles são perfeitamente transparentes em seu próprio processo de trabalho, então eles podem ir para a próxima etapa com confiança, 3) em cada etapa eles tem o discernimento para distinguir um bom trabalho do ruim. Para este sistema de trabalho,os líderes devem criar um ambiente onde os colaboradores possam 4) chamar sempre que eles tiverem dúvida sobre a qualidade de seu serviço e, quando um problema recorrente é identificado, onde eles possam 5) estar envolvido no processo de solução do problema de modo a contribuir diretamente com o melhoramento do ambiente de trabalho dele.

O argumento é que focando nesses 5 pontos, leva ao aumento de senso de orgulho e responsabilidade do seu trabalho, assim como oportunidades para iniciativas e reconhecimento – todos os fatores chave do trabalho gratificante.

A Toyota desenvolveu sua abordagem ao longo de várias décadas. A questão que nos perguntamos era:a fim de aplicar isto em outros contextos, o que poderia explicar a ligação entre tal abordagem para o trabalho e tornar o trabalho gratificante?Nota-se que a perspectiva da Toyota é consistente com uma visão comum de como nossa mente funciona, emergindo da psicologia cognitiva.

Acompanhando a obra fundamental de Amos Tversky e Daniel Kahneman, os psicólogos cognitivos consideram que nossa mente funciona com dois sistemas em paralelo. O primeiro sistema de resposta automática, enquanto o segundo é mais devagar, deliberativo e reflexivo. O 1º sistema é emotivo e intuitivo. O 2º sistema avalia e calcula. O 1º sistema explica nossas reações impulsivas baseado nos estereótipos. O 2º sistema explica que nos podemos calcular probabilidades e investigar os segredos escondidos de natureza cientifica.

O 1º sistema trabalha muito confortável(mesmo prazerosamente) em situações sem nenhuma ambiguidade e onde o caminho é claro. Usando o 2º sistema para resolver quebra-cabeças pode também ser agradável se não existir pressa ou pressão e se o 1º sistema não estiver tentando sequestrar emocionalmente a mente dentro de uma reação de lutar-fugir-congelar. Essencialmente,o que a abordagem da Toyota ao trabalho faz esclarecer a rotina de trabalho para o 1º sistema para desempenhar sem problemas, o equivalente a dirigir no lado certo da faixa numa estrada e não ter que se preocupar com os carros que estão vindo até você como se faz em pequenas estradas nas zonas rurais. Então isso clareia visualmente a diferença entre situações normais e anormais (o equivalente a desenhar a faixa branca). Finalmente, está criado um envolvimento claro (chamado “kaizen”) para os colaboradores usar o 2º sistema na solução de obstáculos suavemente.

Praticando isso diariamente, cria o benefício de colaboradores envolvidos em seus trabalhos abordando passo a passo os problemas do trabalho e desenvolvendo sua capacidade de solucionar problemas, bem como o envolvimento quando eles resolvem problemas com seus colegas de trabalhoe com a ajuda de seusgerentes da linha de frente. Além disso, onde quer que seja difícil reconhecer alguém por “simplesmente fazer seu trabalho” não importa quão bem eles façam, é muito mais fácil para a administraçãoelogiar, e reconhecer o envolvimento dos esforçosde melhoria quetornam o trabalho mais tranquilo e para enfrentar questões técnicas ou comerciais não abordadas anteriormente.

Seguindo um estudo longitudinal, o psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi propôs que nós sentimos experiências ótimas quando nós estamos imersos em um fluxo,realizando uma atividade totalmente imersa em um sentimento de foco energizado, com plena participação e aproveitamento da atividade. Este “sentimento de fluxo” difícil de ser explicad oé encontrado quando o equilíbrio certo é atingido entre a competência percebida e o desafio percebido – quando nos sentimos dono da tarefa com desafio o suficiente para mantê-lo interessante (pense em palavras cruzadas – se é muito fácil é chato, se estiver difícil nós desistimos, mas quando está na medida certa simplesmente vai bem). Esclarecendo as metas com um feedback direto e criando uma dinâmica de eliminação continua de obstáculos para tornar o trabalho fácil, a Toyota procura criar as condições de fluxo na maioria dos trabalhos rotineiros.

Nós acreditamos que a criação de melhores ambientes de trabalho para um trabalho mais gratificante é absolutamente possível, mas as lições tanto da psicologia cognitiva e a prática da Toyota são o que os líderes precisam para mudar sua mentalidade: em vez de procurar projetos de processos sociais de alto nível, a liderança deveria começar de baixo e eles próprios no entendimento dos detalhes do trabalho.

Se a mudança começar com cada colaborador, eles terão que olhar como o ambiente de trabalho está estruturado. Eles devem determinar se eles sentem parte de um time estável e como fica o ambiente social de suas perspectivas. Mais importante, eles devem olhar como eles se sentem com relação ao supervisor imediato (pessoas entram nas empresas e querem demitir o chefe). Deste modo, líderes verão uma enorme oportunidade para melhorar, independente da situação ou a cultura com que eles iniciam. Você não muda a cultura usando “declarações de valor”, mas criando ferramentas práticas para mudança na linha de frente.

Tradução: Raphael Mariano Oliveira

Publicado em 07/08/2014

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