RECURSOS HUMANOS

Treinadores Treinando Treinadores ¹

As olimpíadas são sempre divertidas. É inspirador ver o desempenho humano sendo levado a níveis tão impressionantes. Assistindo aos jogos de Londres, vi-me observando os treinadores quase tanto quanto os atletas.

Gabby Douglas se tornou famosa como a primeira afro-americana a ganhar uma medalha de ouro na ginástica. Conhecida como o “esquilo voador”, Gabby convenceu os jurados com sua habilidade notável de parecer tão leve que literalmente parece voar.

Foi notável assistir seu treinador Bela Karolyi elogiar o desempenho inspirador de Gabby, motivando os outros a serem como Gabby: “Gabby foi como um pássaro em vôo”, ele disse. “Ela vai inspirar uma nova geração inteira de jovens garotas que a estavam assistindo!”. E essas palavras vieram de um treinador lendário que, nas palavras do escritor Atul Gawande, “não poderia fazer uma ruptura se sua vida dependesse disso”.

A equipe de handball húngara chegava nas quartas de final antes de perder a medalha de bronze em uma partida difícil contra a Croácia. O treinador Lazlo Mocsai da equipe húngara havia participado este ano no primeiro summit do Lean Enterprise Institute Hungary, onde o diretor do instituto Szabolcs Molinar o convidou a explorar a dinâmica da melhoria do desempenho humano. O treinador Mocsai nos lembrou que os limites máximos de capacidade são geralmente estendidos um pouquinho de cada vez, por meio da atenção de detalhar minutos para consertar muitas das pequenas coisas que estão erradas enquanto buscam novos níveis de desempenho no geral.

O que nos leva a um pensamento – se o desempenho individual e coletivo pode ser melhorado aos níveis que testemunhamos nos eventos esportivos das Olimpíadas, não podem os mesmos métodos ou dinâmicas de melhoria serem aplicados para melhorar o trabalho? E, se assim for, qual o papel do treinador?

Então, o que é um treinador e por que não tenho um?

Os treinadores nos ajudam a fazer as coisas rotineiras que fazemos habitualmente para que você não tenha nem mesmo que pensar sobre elas, criando o espaço que precisamos para focar nas coisas – coisas que deram errado e aquelas que poderiam ter sido melhores. Os treinadores nos ajudam a colocar mais das coisas que fazemos na categoria rotina e, então, ajuda-nos a considerar o que realmente deveríamos focar – como melhorar as coisas que farão a diferença.

Em seu artigo “Personal Best”, Gawande observa que os atletas top e os cantores têm treinadores e você também deveria ter. Gawande foi um cirurgião bem-sucedido por oito anos que percebeu que enquanto ele tinha melhorado diariamente em seus dois ou três anos, depois disso seu desempenho parecia ter se estabilizado. Após pedir ao mentor para ser seu treinador, Gawande foi capaz de reduzir sua taxa de problemas durante as operações.

“Treinadores não são professores, mas eles ensinam”, observa Gawande, acrescentando que enquanto eles não são seus chefes, eles podem ser mandões. Ele conclui que os treinadores são recursos inestimáveis para qualquer um que busca melhorar seu desempenho. Mas o que os treinadores fazem realmente?

Ele acha que eles principalmente “observam, julgam e orientam”. Os treinadores não são necessariamente mestres da habilidade que ele ensina. Assim como Bela Karolyi se mataria na trave de equilíbrio, meu pai treinou dezenas de adolescentes no esqui aquático ainda que ele mesmo nunca tenta tentado esquiar.

O que grandes treinadores podem fazer é servir como o que os mestres de música consideram “o ouvido” – alguém que pode escutar de perto e ajudar a mantê-los na pista fornecendo feedback e ajudando você a continuar atento a onde você está desejando a desejar. Além disso, no caso de um treinador mestre, tal como John Wooden², ele entende “como dividir o desempenho em componentes críticos individuais” e, fazendo isso, fazer você focar em excelentes detalhes (como se fosse o gemba de desempenho) do que você pode melhorar.

Mestre e Treinador

Quando um treinador também é mestre da habilidade, o impacto pode ser enorme. Eu experienciei isso pela primeira vez há mais de 25 anos na Cidade da Toyota.

Participei de meu primeiro workshop kaizen de três dias, zero sono, em uma célula de solda na planta da Motomachi na cidade da Toyota, Japão. A Motomachi produz sedans, mas estávamos trabalhando em uma pequena linha alimentada longe das operações principais de montagem. A forma como esses eventos funcionam é que você começa observando as condições reais da operação. Isso leva quase todo turno de oito horas para confirmar o que está acontecendo em cada função ou máquina sob condições diferentes. Então, após uma rápida refeição, você tem que confirmar o que está acontecendo na mesma operação durante o turno da noite. Essa confirmação leva, novamente, quase todo turno.

Depois, tendo entendido completamente as condições atuais, é hora da parte divertida – pensar em uma forma melhor. Como tornar o trabalho mais fácil para o colaborador (essa é sempre a parte mais divertida e satisfatória, já que a maioria do tempo você está atrapalhando o colaborador), como eliminar alguns desperdícios, tal como excesso de estoque, ou como consertar um problema recorrente de qualidade. A maioria dessas ideias flui muito facilmente das observações detalhadas que foram documentadas.

Depois que as ideias de kaizen detalharam as coisas, é hora da parte difícil – experimentar as mudanças. Com certeza, nenhuma das ideias funciona corretamente. Às vezes, os colaboradores podem dizer a você rapidamente: “Não, isso não funciona”. Essa tentativa e erro, às vezes experimentos bem-construídos, mas na maioria das vezes apenas tentativa e erro (“não funcionou, vamos tentar esse...”) continuaria, pelo segundo dia, depois pela segunda noite. E, no meio disso tudo, ninguém dormiu. Ninguém. Nem na primeira noite, nem na segunda. Ao amanhecer do terceiro dia, estou – confesso – exausto. Meu sensei para o evento, Usui-sensei, era uma mistura de implacável com paciente.

Estávamos focados na produtividade. Isso é, tentando fazer mais produtos. A incapacidade de alcançar requisitos sem horas extras estava estourando o budget e reduzindo a moral. Principalmente porque mais volume estava a caminho. Nenhuma melhoria significaria mais horas extra necessárias.

E, sem dormir e nossa deadline se aproximando, Usui-sensei ainda estava insatisfeito com a maioria das ideias que surgiram.

Estávamos tentando empurrar a produtividade, empurrar mais produção pela célula. Perguntando, como podemos acelerar esse processo ou aquela etapa.

Finalmente, Usui-sensei perguntou: “Por que você continua tentando empurrar mais quando tudo o que vocês têm que fazer é remover o que está no caminho? Olhe para seus esforços, toda caminhada extra – você não consegue eliminá-la? Olhe para todo o peso daquele material pesado – você não consegue eliminá-lo? Olhe para toda a espera – você não consegue remover os obstáculos para que as coisas fluam suavemente?” E em seguida o complemento, “Você pode realmente fazer mais pelos colaboradores pedindo a eles para fazerem menos”.

Seguindo o evento de três dias, perguntei a Usui-sensei por que ele não nos disse logo no começo. “Eu não disse nada a vocês. Eu só eliminei um obstáculo de sua mente. Eu não poderia eliminá-lo até que ele estivesse no caminho”.

Para mim e para meus aprendizes, foi o treinamento que fez a diferença.

Treinando treinadores

Treinar é uma prática essencial para líderes lean. David Verble, quem ensina “coaching” no LEI, observa que “Se a gestão tradicional está relacionada ao pensamento (geralmente tentando fazer o pensamento para outros), liderar por meio do pensamento lean e praticar está relacionado a fazer os outros pensarem... e pensar sobre as coisas certas”. E essa é a essência de um bom treinamento.

O treinamento habilidoso foca a atenção nas coisas certas para o desempenho da melhoria. Então, não deveria a mesma dinâmica ser aplicada ao treinamento? Eu acho que sim. Posso não ter nascido com a habilidade de treinamento inspiradora de Bela Karolyi, mas posso abordar o treinamento como faria com qualquer outra habilidade e determinar – talvez com a ajuda de um treinador habilidoso! – para melhorar e melhorar.

Notas da tradutora:

  1. Título traduzido e adaptado do original “Coaches coaching coaches”. Coach em inglês tem tanto o sentido de treinador (técnico de esportes) como o sentido de mentor (orientador).
  2. Ex-técnico de basquete masculino da UCLA, maior ganhador de títulos da história.

Traduzido por Tamiris Masetto Manzano.

Publicado em 28/08/2012

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