GESTÃO DA PRODUÇÃO

E você esqueceu da produção em excesso

É nos momentos de crise e caos que os mercados se realinham. Empresas sairão do negócio e participações de mercado se transformarão muito mais rápida e radicalmente durante uma verdadeira crise do que normalmente é possível. Esse é o momento no qual as empresas enxutas vão tirar proveito da turbulência para fortalecer sua posição. É quando os princípios verdadeiramente críticos da mentalidade enxuta começam a se destacar.

Crise e fundamentos, fundamentos e produção em excesso (“overproduction”).

Na pressa para atender a demanda de alguns períodos extraordinariamente prósperos dos últimos 15 anos – o boom das empresas ponto-com, o fenômeno chinês, o crédito fácil na derrocada dos empréstimos imobiliários– talvez o princípio mais elementar da mentalidade enxuta foi negligenciado. Conforme as várias forças da última década aumentaram a capacidade em todo o mundo, a atenção ao desperdício da produção em excesso foi deixada de lado.

Na empolgação de toda essa corrida para aumentar a capacidade, para acompanhar a demanda esperada, para permanecer à frente, onde ficou a consideração aos princípios mais básicos do Sistema Toyota de Produção (TPS)? Onde estava a produção em excesso?

Você se lembra quando ouviu falar pela primeira vez sobre produção em excesso? Certamente você não entendeu esse ponto direito. Entendeu? Afinal de contas, "produção em excesso" é um termo um tanto estranho. Certamente você não quer produzir mais do que necessita, então qual é o problema?

Honestamente, levei muito tempo para entender isso. Não consigo me lembrar exatamente quando a luz se acendeu. Talvez, mais do que um momento particular de "aha", é uma questão a digerir pouco a pouco.

Os sete desperdícios e a empresa que adotou o princípio kaizen sobre eles.

Há alguns anos, tive o prazer de trabalhar e aprender com uma empresa que progrediu muito imediatamente após iniciar sua iniciativa lean na produção. Os líderes aprenderam os vários fundamentos do TPS, incluindo os sete desperdícios e todo o resto. Bem, não “tudo”. Entre os elementos que eles aprenderam, havia o princípio de fazer mais com menos. E eliminar o desperdício.

No seu entusiasmo inicial de aplicar a mentalidade a tudo, eles decidiram rapidamente que, uma vez que menos é mais, seis deve ser melhor do que sete, e decidiram aplicar o princípio “kaizen” – para eliminar – um dos sete desperdícios. Curiosamente, dos sete, eles escolheram a … produção em excesso.

Além de aprender que menos é melhor, eles também analisaram de perto os sete desperdícios e decidiram que o conceito de "produção em excesso" estava coberto, perfeitamente bem, pelo desperdício de "estoque". E, sim, certamente a produção em excesso resulta em estoque, portanto, se focarmos em eliminá-lo, também vamos eliminar a produção em excesso. Matar dois coelhos com uma pedrada só, por assim dizer.

Encontrei muitas empresas que adicionaram um oitavo ou até mesmo nono desperdício (geralmente relacionado ao desperdício de capital humano, algumas vezes de "tempo" ou "ambiente"), mas essa foi a única vez em que vi uma empresa decidir especificamente reduzir o número (embora tenha visto empresas deixar de considerar TODOS os desperdícios). E é fascinante que, de todos os desperdícios, eles decidiram que a produção em excesso seria o desperdício a ser eliminado da sua lista.

Repensando a produção em excesso

Mas você sabe que a produção em excesso é um desperdício não apenas porque gera estoques desnecessários. Certo? Eles são na verdade coisas muito diferentes. Relacionados, claro, mas muito diferentes. Certo?

Aqui está a idéia básica: O elemento fundamental para construir um sistema que elimina totalmente as fontes de todos os desperdícios é eliminar a produção em excesso.

O processo e práticas da mentalidade enxuta se alinham em torno de objetivos que são elaborados para evitar a produção em excesso. Essa é a maneira na qual uma empresa enxuta diminui o tempo de ciclo para fornecer produtos e serviços aos clientes. Estar atento em evitar a produção em excesso gera flexibilidade e caixa que, por sua vez, agrega valor para os clientes e prosperidade para as empresas.

Certamente o Sr. Ohno tornou os sete desperdícios famosos, mas posteriormente ele falou em arrependimento. Nunca houve nada mágico sobre o número sete. Em vez disso, são muitos os tipos de desperdícios e não importa o quanto você se esforce para eliminá-los, certamente haverá resquícios desses sete. E para eliminar cuidadosamente esses sete desperdícios, você certamente precisa mudar profundamente seu sistema de produção. E o elemento central para construir um sistema para eliminar totalmente as fontes de todos os desperdícios pode ser encontrado no caminho para eliminar a produção em excesso.

A produção em excesso nunca quis dizer apenas "não produzir demais", assim como o "sistema puxado" não significa apenas "ir buscar o que você precisa, quando necessita". Produção em excesso significa alinhar oferta e demanda, para obter o "item correto na quantidade correta no momento certo". Isso quer dizer conhecer a sua demanda muito, mas muito bem. Também significa conhecer a sua "oferta", sua capacidade, sua capacitação, muito, mas muito bem. E essa é a maneira na qual as ferramentas JIT o ajudam. Elas o auxiliam a conhecer sua demanda e capacidade reais profundamente, permitindo assim que você trabalhe para alinhá-las constantemente. Isso é difícil nos dias de hoje, com a capacidade atualmente instalada, e ainda mais difícil amanhã, com uma capacidade ainda em consideração para atender a demanda que, no final do dia, vai variar.

Estou sugerindo que a maioria das empresas, até mesmo as empresas "enxutas", esqueceu a produção em excesso nos últimos anos. Talvez sua empresa seja diferente, mas, honestamente, não ouço mais ninguém falar sobre produção em excesso. Ou, não até muito recentemente, quando as empresas repentinamente se depararam com problemas de capacidade e estoques enormes.

Não apenas as pessoas não falam mais sobre esse tema, como não se concentram mais nele ao projetar seus sistemas operacionais. Ou quando definem seus padrões operacionais. Ou quando adquirem capacidade – quando contratam funcionários e compram equipamentos.

Até tu Toyota?

Até a Toyota, como vocês sabem, parece ter esquecido a produção em excesso. Suponho que estejam se lembrando – ou tenham sido relembrados pelas circunstâncias (fatos, gemba, genchi gembutsu, realidade) – violentamente nos dias de hoje. As fotos dos veículos da Toyota nas docas e relatos de aumento nos estoques de veículos acabados contam parte da história. Histórias de fornecedores com os padrões de pedidos "estilo Três Grandes" foram ainda mais perturbadoras para mim. A substituição contínua do velho cartão Kanban simples pelo e-Kanban também me causa inquietação (talvez eu seja apenas antiquado).

E você? E sua empresa?

Talvez possamos compartilhar algumas experiências aqui. Há diferentes maneiras de aumentar ou aumentar novamente a conscientização, maneiras que deverão começar no chão de fábrica ("melhor agir da sua maneira para uma nova maneira de pensar…").  Mas talvez a melhor maneira de desempenharmos o nosso papel aqui é compartilhar experiências. Sua empresa esqueceu da produção em excesso? Ela alguma vez se concentrou na produção em excesso? (Estou dizendo que a maioria não.) A produção em excesso é entendida na sua empresa?

Publicado em 29/04/2009

Planet Lean - The Lean Global Networdk Journal