ESTRATÉGIA E GESTÃO

Lou Farinola, veterano da GM, responde à pergunta Por que a GM não aprendeu com a NUMMI?

Você vai se lembrar de uma coluna recente onde abordei a pergunta "Por que a GM não aprendeu com a NUMMI?" Recebi muitas respostas para essa discussão, o que me convenceu de que muitos de vocês gostariam de saber mais sobre o assunto. Em vez de apenas transmitir-lhes meus pontos de vista, decidi que seria uma boa idéia obter uma perspectiva de uma pessoa de dentro da própria GM sobre o tópico. Dessa forma, pedi a um amigo meu da GM com profundos conhecimentos sobre os esforços da empresa para explorar ao máximo sua experiência com a joint venture da NUMMI para refletir sobre a pergunta e fornecer sua perspectiva. Lou Farinola se aposentou recentemente, após 39 breves anos na GM. De 2002 a 2007, ele foi responsável por liderar o Sistema de Manufatura Global da GM. Lou também trabalhou na Cadillac em 1986 quando as pessoas que mencionei na minha coluna regressaram da NUMMI e tentaram implementar pela primeira vez o Sistema Toyota de Produção (TPS) na GM. Portanto, Lou é exatamente a pessoa certa para compartilhar seus conhecimentos e sabedoria sobre o que aconteceu, o que não aconteceu, e por quê. Lou e eu esperamos que você considere as perspectivas abaixo valiosas.

Então Lou, como você responderia à pergunta "Por que a GM não aprendeu com a NUMMI?"

Lou: Bem John, como afirmei no seu blog em dezembro, uma resposta simples poderia ser que a GM de fato aprendeu muito com a NUMMI e continua aprendendo atualmente. No entanto, também é verdade que demoramos bastante para realmente entendê-la e para mudar fundamentalmente a maneira na qual projetávamos e construíamos veículos como resultado.

John: Dê-nos uma idéia do que aconteceu na GM naquele período inicial.

Lou: Quando as pessoas que mencionei que estavam baseadas na NUMMI para aprender por alguns anos voltaram para a  "GM tradicional" no final da década de 1980, o livro A máquina que mudou o mundo ainda não tinha sido publicado e havia um número relativamente baixo de pessoas que reconheciam que a Toyota estava mudando a manufatura de maneira definitiva. Eu trabalhei para o Diretor de Pessoal Divisional naquela época e lembro-me das conversas sobre o que fazer com esse grupo de executivos que tinha acabado de passar dois anos aprendendo o TPS. Algumas pessoas achavam que eles deveriam ser consultores da nossa equipe de produção e outros, incluindo meu chefe, acreditavam que eles deveriam ter a oportunidade de dirigir uma fábrica e demonstrar o novo sistema. Por fim, chegou-se a um consenso de utilizá-los como consultores. Isso poderia ter funcionado em um ambiente receptivo, mas infelizmente eles estavam em uma organização que via nenhuma ou pouca necessidade de mudar.

John:  Também me lembro de ouvir que eles pediram para ser colocados juntos, para que pudessem apoiar uns aos outros, mas acabaram sendo dispersos em áreas distintas do imenso sistema GM. Então no início havia resistência demais à mudança para que eles pudessem superá-la?

Lou:  Sim, eles ficaram juntos por um curto período de tempo, mas então se separaram, indo para diferentes áreas e a resistência à mudança era um fator importante, mas também diria que a equipe tentou levar a organização GM para onde pensava que ela deveria estar, mas sem ponderar suficientemente sobre onde a organização estava naquela época. Por exemplo, eles colocaram muita ênfase no poder da equipe no chão de fábrica. Certamente, o conceito de equipe é um conceito chave do TPS. Mas a montadora da Cadillac acabara de ser construída e estava organizada em equipes e coordenadores de equipe, portanto, a liderança acreditava que já tinha "equipes prontas" e consequentemente o conceito de equipe da NUMMI não parecia ser diferente do que nós já estávamos fazendo. Sem dúvida, o entendimento das equipes, líderes de equipe e, mais importante, comportamentos gerenciais pela organização exigidos para fazê-la funcionar não atingiu a maturidade até muitos anos mais tarde. Além disso, não havia compreensão de todos os outros elementos de uma organização enxuta (lean) e da integração desses elementos no sistema enxuto total.

John: Então, o que é necessário para começar a mudar a empresa?

Lou:  Na verdade, foi necessário muitas coisas e diversos anos. Vamos começar com a GM Europa. Em 1992, uma nova fábrica foi construída em Eisenach, Alemanha. Essa fábrica era liderada por um Pensador Lean carismático que foi treinado no Sistema de Produção da Suzuki na fábrica da CAMI no Canadá. A fábrica foi construída para ser um exemplo de uma montadora enxuta e ainda é uma das melhores da GM atualmente. A GM Europa se convenceu e a fábrica de Eisenach tornou-se um centro de treinamento para os líderes de produção da GM em toda a Europa e a liderança da GME ampliou o esforço contratando diversos gerentes da Toyota e da NUMMI para criar massa crítica de Pensadores Lean para fazer a mudança durar. Eles até mesmo contrataram um sensei em TPS de destaque da Toyota Japão para ajudar a treinar a liderança.

Nos EUA, começamos a levar o assunto a sério em 1994, quando a mesma montadora da Cadillac foi selecionada como a fábrica com "Visão Lean" designada para demonstrar que uma operação existente poderia convertida em uma fábrica enxuta. Eu era o Gerente Geral da Área de Montagem na época e tínhamos um Diretor de Materiais que passara dois anos na NUMMI. Um ponto importante a destacar aqui é que as pessoas que estavam retornando dos projetos da NUMMI estavam começando a se mover e galgar cargos mais altos na organização em posições de linha onde poderiam realmente começar a fazer a diferença. De qualquer modo, esse Diretor de Materiais, com alguma ajuda do escritório central determinada pelo Gerente de Produção (a mesma pessoa que dirigia a Eisenach e que agora foi promovida na volta para os EUA) decidiu começar mudando fundamentalmente o sistema de gerenciamento de materiais para a fábrica. Eles trabalharam no fluxo interno e externo de materiais, indo para lotes muito menores e extraindo em vez de incluir o material na linha. Definimos uma meta de não mais de duas horas de material na operação, não mais de um dia de material na fábrica e todo material na área do operador. Essa estratégia acabou sendo um ótimo ponto de partida uma vez que demonstrou resultados de negócio positivos e também criou alguns novos cargos importantes que a maioria das pessoas considerava desejável ocupar. O fluxo de materiais aprimorado permitiu que eu e minha equipe de produção embarcássemos em diversas outras estratégias, tais como a configuração da estação de trabalho, diminuição da linha, paradas em posições fixas e instalação de pequenos "buffers" no sistema transportador. Poderia ficar falando sobre o que fizemos por horas, mas o ponto que desejo destacar é que, para nós, o sistema de materiais era o lugar certo para começar. Também devo dizer que conforme os gerentes voltaram da NUMMI e assumiram projetos em outras fábricas da GM, algo similar ocorreu em praticamente todas as localidades.

John: Então você tinha os EUA e Europa seguindo caminhos paralelos.

Lou: Sim, paralelos, mas diria que não coordenados.

John: Sendo assim, como o Sistema de Manufatura Global começou?

Lou: Boa pergunta, e é nesse ponto que a liderança desempenhou um papel chave. Em 1996, a GM decidiu construir quatro novas fábricas em quatro países: Polônia, China, Tailândia e Argentina. O CEO na época, Jack Smith, estava muito comprometido com uma estratégia de tornar todos os sistemas operacionais da GM globalmente comuns. Ele apontou que uma vez que essas fábricas seriam fábricas GM, esperava que todas elas tivessem o mesmo sistema operacional com princípios e elementos comuns. Nessa época tínhamos um bom número de pessoas com conhecimentos lean e precisávamos fazer com que todos tivessem o mesmo entendimento. Portanto, representantes da América do Norte, América Latina/África e Oriente Médio, Europa e Ásia se reuniram em Eisenach para trabalhar com as equipes que construíam as novas fábricas para desenvolver o que é atualmente o Sistema de Manufatura Global da GM.

John: Com base em todos os relatos e de acordo com um grande número de medidas objetivas, a produção da GM tinha percorrido um longo caminho. E está claro que todos estão falando uma linguagem comum no que se refere ao pensamento lean. Em que parte da jornada lean você diria que a GM se encontra?

Lou: Bem, obviamente ainda temos muito trabalho a fazer, mas diria que há uma base muito boa e um progresso real vem sendo obtido nos últimos 10 anos. Analisando cada um dos Cinco Princípios que compõem o Sistema de Manufatura da GM, diria que somos muito sólidos nas áreas de trabalho padronizado, qualidade incorporada, fluxo de materiais enxuto e melhoria contínua. Essa última é muito importante por que promove uma mentalidade que nunca acabamos. A área onde sempre enfrentamos o maior desafio, especialmente nas fábricas mais antigas, é o envolvimento das pessoas. Não me entendam mal, temos fábricas em cada região que também são exemplos excelentes desse princípio. Mas devo dizer que temos mais trabalho a fazer para atingir o nível que você mencionou na publicação >Gerenciando para o aprendizado.

John: Bom, vamos parar por aqui por enquanto e ver o que os leitores pensam. Se as pessoas acharem válido, você estaria disposto a responder algumas perguntas adicionais sobre a experiência da GM?

Lou: Claro.

Obrigado Lou. Eu mesmo tenho outras perguntas, mas vou parar por aqui e veremos o que os nossos leitores vão perguntar. Quem sabe talvez o Senador Corker do Tennessee se junte a nós.

Publicado em 06/04/2009

Planet Lean - The Lean Global Networdk Journal