ESTRATÉGIA E GESTÃO

O problema com o Trabalho Criativo e o Gerenciamento Criativo

O artigo levanta o problema da má interpretação sobre criatividade no trabalho e destaca principalmente que esta boa intenção de utilização da criatividade pode ser na realidade puro re-trablho e desperdício.
Tradução: Christopher Thompson.

Anos atrás eu assisti uma apresentação de alguém da Toyota explicando onde começar a implementar o Sistema Toyota de Produção. "Comece analisando o trabalho a ser feito." Isto significava listar todas as ações requeridas para criar o valor em um dado produto e então dividir estas ações em três categorias:

Trabalho que agrega valor. Atividades que adicionam valor diretamente ao produto como determinado pelo cliente. (Os exemplos de manufatura estão em pintar o produto ou então adicionar partes durante a montagem do conjunto.) Um teste simples é perguntar para os clientes se, apesar do produto funcionar corretamente, eles se importariam por uma dada atividade não ter sido realizada. Caso se importem, a atividade agrega valor. Por exemplo, quase todos os clientes esperam que seus produtos sejam pintados com todas as peças montadas; assim, estas atividades criam valor.

Trabalho incidental. As atividades que são atualmente necessárias para criar um produto para um cliente, mas que não têm nenhum valor do ponto de vista do cliente. Os exemplos incluem a manipulação de materiais, dispositivos de travamento do produto durante o trabalho e retorno de cartões kanban. Nenhum cliente oferece pagar mais porque todos os cartões kanban foram retornados ao ponto de programação!

Desperdício. Atividades que não criam nenhum valor e podem ser eliminadas completamente. Os exemplos incluem o re-trabalho, armazenar partes entre etapas de trabalho e procurar por materiais faltantes. Nenhum cliente em qualquer lugar quer pagar por estas atividades e não há nenhuma necessidade para elas serem feitas se os princípios enxutos forem aplicados corretamente.

Definir as categorias das etapas existentes é uma boa maneira de começar a pensar de forma enxuta, e é consideravelmente fácil em um ambiente de fábrica ao desenhar o mapa do fluxo de valor. Mas quando os pensadores enxutos se movem além da fábrica, como tantos estão fazendo hoje, é comum ocorrer confusões sobre a natureza do trabalho. Em particular, em ambientes de escritório e saúde, manutenção, revisão, varejo, e outros ambientes de produção que não envolvem fábricas, muitos empregados e gerentes me dizem que estão fazendo "Trabalho Criativo." Afirmam que o resultado de cada etapa é imprevisível, pode ser necessário alterar etapas para cada novo produto, e esse trabalho não pode ser planejado claramente. Assim não podem definir de modo fácil as etapas necessárias para atingir um dado resultado. De suas perspectivas, a maioria das etapas que estão fazendo atualmente criam valor, e não é trabalho incidental e muito menos desperdício.

Entretanto, quando eu observo seus trabalhos geralmente vejo algo muito diferente. Algumas poucas situações realmente requerem modificações criativas no meio do processo - o paciente que tem um ataque cardíaco durante uma apendicectomia rotineira - mas a maioria de trabalho, mesmo fora da fábrica, é realmente rotineiro. Isto é, as mesmas etapas necessitam ser executadas da mesma maneira todas as vezes para obter bons resultados e a maioria das atividades se encaixam claramente em famílias de produtos que devem ser executadas repetidas vezes. A apendicectomia padrão, o fechamento mensal dos livros, a manutenção de um 747.

A razão que o trabalho parece ser "criativo" é porque as famílias de produtos não estão claramente identificadas, nenhuma das etapas está claramente definida, e muitos processos de apoio necessários para executar com sucesso cada etapa estão faltando. Por exemplo, quando os instrumentos ou os medicamentos necessários para uma etapa seguinte em um procedimento médico estão faltando, o doutor, enfermeira, ou o técnico vai à "caça ao tesouro" para encontrá-los. O que parece aos funcionários como sendo em grande parte ações que agregam valor e poucas que não agregam, realmente me parecem como sendo ações que pouco estão agregando valor, algumas que não agregam e são necessárias e uma enorme quantidade que são simplesmente desperdício.

Mas este não é todo o desperdício que eu vejo. Olhando um nível atrás do ponto do trabalho primário, eu vejo exércitos de gerentes que correm loucamente tentando solucionar problemas que travam os processos. Muitas de suas "saídas" são certamente "criativas." Mas o cliente realmente quer pagar pelas intervenções da gerência (isto é, pelo re-trabalho) nos processos que não requereriam nenhuma intervenção se projetados corretamente? Certamente estes são todos exemplos de criatividade que nós poderíamos conviver sem, e é uma pena que poucos funcionários e gerentes percebam que em muitos casos a criatividade e o re-trabalho são a mesma coisa.

Por favor, não entenda mal: há verdadeiramente um trabalho criativo a ser feito dia-a-dia. Por exemplo, encontrando uma nova maneira engenhosa de projetar um produto no qual ninguém pensou antes. Mas esta é uma fração muito pequena do trabalho total e a maior parte do que é denominado "trabalho criativo" é realmente puro desperdício.

Por contraste, o ato verdadeiramente criativo que todos nós devemos realizar como funcionários e gerentes deve ser repensar fundamentalmente sobre os processos que efetuamos e gerenciamos, para que as famílias de produtos estejam claramente identificadas, cada etapa precisamente especificada e padronizada, eliminando assim desperdícios e reduzindo etapas que são necessárias e não agregam valor. Mas até aqui temos que utilizar o processo padronizado de mapeamento do fluxo de valor com a analise em A3. Este é o papel real para a criatividade no trabalho.

Publicado em 21/09/2005

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