SAÚDE

Área da saúde do futuro? Utilizando a ferramenta lean 3P para construir melhores hospitais

Melhorar a arquitetura na área da saúde significa verdadeiramente atender os requisitos do paciente. Esse artigo reflete sobre o poder dos 3P e chama a atenção para uma implementação no Nordeste da Inglaterra.

Eis um dado interessante: desde 2012-2013, a NHS tem aumentado seus níveis oficiais de investimento em 4,5%. Esse dinheiro está sendo usado efetivamente? Minha visão pessoal é que estamos gastando grande quantidade de dinheiro para projetar hospitais e instalações de saúde excessivamente grandes.

Assim como o projeto de produtos, que pode representar 80% dos custos finais, o projeto de um hospital pode acumular custos significativos também. Uma gestão visual ruim, que muitas vezes não é facilmente identificada nos projetos, pode ter impactos diretos sobre a performance dos profissionais – especialmente em cenários de alta acuidade.

Em um caso com o qual estou familiarizado, o pessoal foi forçado a criar soluções alternativas, como colocar monitores de bebês em todos os quartos, ligá-los e voltar às estações de trabalho para lidar com outros problemas. Os monitores eram todos da mesma marca e operavam no mesmo nível de canais limitados. Como consequência, eles tiveram que comprar vários outros monitores, de quatro marcas diferentes, para evitar o conflito entre os canais. Essa foi a solução, pois ninguém iria mudar drasticamente uma unidade para crianças recém inaugurada tão cedo.

Imagine algo assim acontecendo em uma unidade nova, multimilionária; não deveria, mas aconteceu. Que tipo de impacto isso teria na segurança do paciente?

O PROBLEMA

A arquitetura na área da saúde pode ser muito complicada, particularmente quando tem a ver com definir requisitos que precisam ser acomodados em projetos futuros. Organizações da área da saúde podem usar uma mistura de lean e inovação para obter uma descrição bem mais detalhada, o que permitirá o projeto de aspectos melhorados de segurança, qualidade, fluxo e valor para o paciente. Mais importante, eles podem prevenir erros bobos, com os quais o pessoal da linha de frente e os pacientes teriam que lidar permanentemente no futuro. Isso pode incluir riscos mais altos quanto a controle de infecção, problemas ergonômicos, como ter apenas um banheiro para seis pacientes que estejam se recuperando de uma colonoscopia, um procedimento que provavelmente resultará em diversos paciente precisando usá-lo ao mesmo tempo.

Imagine um dia cheio com quatro ou cinco salas de tratamento em somente uma área de recuperação; as filas para o banheiro cresceriam rapidamente.

É aqui que os 3P (Produção, Preparação, Processo) podem ajudar a aliviar o problema. Veja, quando se trata de projetar novos prédios na área da saúde, nem sempre todos os interessados têm voz no processo do projeto. Isso pode resultar em um projeto abaixo dos padrões, assim como em projetos muito caros, que não atendem de verdade a necessidade de paciente e funcionários.

A SOLUÇÃO

Por que gastar dinheiro? Não deveríamos nos sentir obrigados a garantir que cada centavo seja usado da melhor maneira possível? Então por que não trabalhar com a linha de frente, apoiar o pessoal e liderá-los em uma atividade 3P? 3P é uma abordagem que visa atender os requisitos do cliente com o mínimo de desperdício possível. Na área da saúde, ela pode ser usada para compreender perfeitamente o que é importante para o pessoal e para os pacientes a fim de criam uma experiência perfeita para eles. Isso é alcançado através de uma série de interações ao longo do projeto, incluindo quadros de visão, diagramas de bolha e reproduções em grande escala.

Para entender as necessidades do paciente, precisamos envolvê-los também. Por mais assustadora que essa idéia possa parecer para alguns, os 3P oferecem uma plataforma para o envolvimento do paciente e realmente permitem que você foque sua capacidade criativa naquilo que importa mais para os pacientes. Quando você combina isso com a sabedoria coletiva do pessoal da linha de frente, e escuta de verdade o que funciona e o que não funciona, você está demostrando respeito em relação a eles. Você também está permitindo a eles escutar o que importa para os pacientes e projetar soluções conjuntamente. Você não está impondo uma nova instalação para eles, que envolveu, no máximo, alguns consultores sentados ao redor de um grupo foco, mas está colocando o processo na cabeça deles e considerando o que realmente importa.

O PODER DO ENVOLVIMENTO DO PACIENTE

Com os 3P, você está fazendo mais do que escutar. Você está despertando a criatividade humana que existe em cada um. Esse tem sido um grande desafio, já que as pessoas podem ser um pouco apreensivas no início. Historicamente, erros podem ter sido estigmatizados e, como resultado, as pessoas comportam-se como esperado. Mesmo assim, com um pouco de encorajamento, começam a se abrir e a participar. Não demora muito para que façam protótipos que permitam enxergar as coisas de verdade. Eles rapidamente se envolvem nessa oportunidade.

UM MINI ESTUDO DE CASO

O primeiro experimento de 3P aconteceu em uma unidade de endoscopia na Geteshead Health NHS Foundation Trust. Foi projetada nos anos 80 e evoluiu com o tempo. Uma nova tecnologia para o diagnóstico de câncer de intestino significava demanda em alta. Alguns dos participantes tinham sido envolvidos em eventos do tipo kaizen/RPIW, mas a maioria não; então, o desafio precisava ser superado. Isso foi alcançado ao colocar uma recompensa na aplicação das práticas lean através de coaching e desafios efetivos.

O grupo começou analisando formas de eliminar etapas que geravam desperdício no caminho do paciente. Então, propuseram alternativas e traduziram essas opções de estado futuro em diagramas de bolha. Isso permitiu que criassem e explorassem muitos planos 2D diferentes. Foi durante esse tempo que foram capazes de testar o comportamento esperado dos sete fluxos da área da saúde* (pacientes, provedores, medicações, informações, familiares, estrutura e profissionais da assistência – * nota da tradução). Chegou, então, a hora de testar diferentes tamanhos de leitos e salas de tratamento. Esses leitos tinham o objetivo dar assistência ao paciente. Processos como consentimento, pré-otimização e preparação aconteceriam nesses leitos. Isso traria o benefício de eliminar a maioria da locomoção para pacientes. As equipes faziam mais testes nesses quartos e levavam o aprendizado adiante para uma última rodada de interações no projeto, através de protótipos rápidos onde mais melhorias eram propostas.

O projeto final reduzia a distância de locomoção do paciente em 26%. Reduziu as filas de cinco para uma e, mais importante, a equipe foi capaz de voltar à configuração original dela e aplicar parte do aprendizado imediatamente. Enquanto eu fazia observações no gemba, e desenhava alguns diagramas de espaguete, percebi que após cada procedimento (atualmente 9.800 por ano), um assistente ou, muitas vezes, uma enfermeira, saía do quarto e fazia uma viagem de ida e volta de 74 metros para a área de descontaminação a fim de dispensar um dispositivo sujo para processamento e trazer um novo de volta para o próximo paciente.

Desafiei uma das subequipes para que explorasse esse problema e explicasse o papel de uma aranha d’água para eles* (sistema de abastecimento lean, que consiste em fazer entregas frequentes de pequenos lotes – * nota da tradução). Eles rapidamente entenderam e desenvolveram um novo sistema, com um pouco de coaching e ciclos PDSA. Isso, somado a outra atividade de redução na configuração, reduziu o tempo de preparação da sala de procedimentos em 3 minutos por ciclo. Mais importante, foi facilmente replicado para todos as 4 salas de tratamento, com a vantagem de que mais listas de pacientes passaram a ser concluídas a tempo. Isso foi bom para a equipe e para os pacientes, particularmente para os pacientes, que passaram a esperar muito menos.

ESSE É UM PROBLEMA DE PESSOAS OU DE SISTEMA?

Hospitais e arquitetos do Reino Unido são encorajados a usar as próprias diretrizes dos prédios relacionados à área da saúde para ajudar a desenvolver o projeto desses prédios. Isso é feito na maior parte dos casos e, muitas vezes, o resultado final pode ser ruim em termos de privacidade e dignidade e, provavelmente, é simplesmente uma versão ampliada do que já existe. Nesse caso, eu diria que é claramente um problema de sistema: recomendações impostas, que estão bem longe dos modelos atuais da linha de frente para uma melhor prática, podem significar resultados abaixo dos padrões. Lamentavelmente, esse é o caso em muitas unidades de endoscopia ao redor do país.

Para atacar a situação, nos últimos dois anos, a NHS investiu milhões em ajustes para unidades de endoscopia com privacidade de paciente “embutida” e problemas de dignidade.

Alguns têm uma falta de distinção entre rotas limpas e sujas, aumentando, assim, os riscos quanto ao controle de infecções. E quanto aos exemplos de pacientes internados, que podem estar sofrendo de diferentes condições, sendo empurrados em macas e cadeiras de rodas, enquanto passam por pacientes ambulatoriais, que somente estão tentando entrar e sair do processo o mais rápido possível? Os hospitais já são lugares assustadores para muitas pessoas – não precisamos piorar ainda mais as coisas.

CONCLUSÃO

Quantos hospitais têm esse entendimento, oferecendo a seu pessoal a oportunidade de co-projetar a área onde trabalham? Há um número crescente de exemplos na América do Norte e outros na Europa, mas essa abordagem ainda está no início, particularmente na NHS. Considere que, em uma unidade relativamente pequena de 857 metros quadrados, em um turno típico, algumas enfermeiras andavam 7,6 quilômetros; isso é aproximadamente 91 minutos andando por dia. Você pode extrapolar isso para chegar à ideia de o que acontece em unidades hospitalares ainda maiores.

Por que estamos gastando milhões construindo instalações com falhas inerentes, quando isso podia ser minimizado durante o estágio do projeto, usando feedback dos pacientes e do pessoal? Muitas vezes, os projetistas, arquitetos e até os profissionais da área da saúde, fazem suposições que acabam custando muito caro. Isso leva a provisões pouco adequadas sob a ótica dos pacientes. Quando usados corretamente, e alinhados efetivamente com a estratégia e propriedades da organização, os 3P oferecem uma forma de minimizar essa lacuna (gap) no desempenho.

O AUTOR

Gary Prior é Gerente do Programa de Projeto Lean de Espaço para o Sistema de Transformação Nordeste da NHS (NETS). NETS é uma melhoria colaborativa que ajuda outras organizações da NHS em sua jornada de melhoria da qualidade. O projeto da área da saúde lean NETS foi parte do Programa de Proposta Compartilhada da Fundação de Saúde. A Fundação de Saúde é uma caridade independente que trabalha para melhorar continuamente a qualidade da área da saúde no Reino Unido. Entre em contato com Gary pelo twitter @GaryPrior ou no LinkedIn.

Fonte: Planet Lean.

Publicado em 07/04/2015

Planet Lean - The Lean Global Networdk Journal