FINANÇAS E CONTABILIDADE

Muitos Problemas

Montadoras dos EUA utilizavam uma prática comum de contabilidade para justificar o aumento de estoques, mas os efeitos negativos ensinam a todos os fabricantes.

Não é segredo para ninguém que nos anos que antecederam a Grande Recessão, as Três Grandes montadoras estavam produzindo veículos excessivamente em relação à demanda do mercado, levando a enormes estoques nas concessionárias em todo o país. Agora, alguns pesquisadores dizem que sabem por que as montadoras agiam daquela maneira e estão alertando os outros produtores para evitarem cair na mesma tentação.

Ao unir o excesso de produção com o custeio por absorção, os gerentes da GM, Ford e Chrysler eram capazes de alavancar lucros e alcançar metas no curto prazo, de acordo com os professores da Michigan State University e Maastritch University, na Holanda. (Seu estudo sobre o tema foi reconhecido em janeiro por sua contribuição à gestão contábil da pelo American Institute of Certified Public Accountants e outros grupos). Enfim, a prática prejudica as montadoras, em parte pelo aumento da publicidade e estoques aumentando os custos e possivelmente causando um declínio na imagem da marca, dizem os pesquisadores.

De 2005 a 2006, bem antes da GM e da Chrysler abrirem falência e solicitarem auxílio federal, as montadoras tinham capacidade em excesso. Naquela época, tal como agora, elas tinham custos fixos enormes, das fábricas e maquinários aos colaboradores, cujos contratos os protegiam de desligamentos quando a demanda estivesse baixa, diz Karen Sedatole, professor associado de contabilidade na universidade de Michigan e coautor do estudo.

Para “absorver” esses custos massivos, as montadoras produziam mais carros enquanto usavam o custeio por absorção, um sistema amplamente usado que calcula o custo da manufatura de um produto, dividindo os custos totais de manufatura, fixos e variados pelo número de produtos feitos. Quanto mais veículos eles faziam, menor era o custo por veículo e mais alto eram os lucros. Como resultado, as montadoras mudavam os custos da declaração de rendimento para a folha de balanço na forma de estoque.

Sob o Informe de Rendimentos Financeiros de Nº 151, as empresas podem usar o custeio por absorção para “capacidade normal”, mas deve tratar o excesso de capacidade “anormal” como um custo temporário, de acordo com Sedatole. Mas o padrão não define claramente o que é normal, deixando espaço para as empresas produzirem excessivamente a fim de diminuírem o custo por unidade. As empresas que fazem isso “estão, de certa forma, gerenciando lucros ascendentes e alocando os custos na folha de balanço como estoque para que elas não prejudiquem o informe de rendimento”, disse ela.

Desgastando a Imagem da Marca

Mas os líderes do negócio deveriam pensar duas vezes antes de adotar essa tática, adverte Sedatole. Mesmo que eles possam fazer suas empresas parecerem mais lucrativas no curto prazo, ocultando o excessivo custo de capacidade sobre a folha de balanço, manter tanto estoque em excesso pode exigir um preço alto.

“Quando [as concessionárias] não conseguem vender carros, elas se sentam nos estoques”, diz Sedatole. “Elas teriam que entrar e substituir os pneus, e havia custos associados a isso”. As empresas também tinham que pagar pela propaganda de seus carros, geralmente com desconto nos preços. E tornando seus carros mais baratos e mais prontamente disponíveis, eles podem ter alijado clientes potenciais, ela acrescenta.

“Se você vê um carro de $12.000 em uma propaganda na televisão sendo oferecido por $6.000 em uma concessionária local, isso afeta a imagem desse veículo”, disse Sedatole. Esse efeito sobre a imagem da marca é difícil de quantificar, mas os pesquisadores correlacionam 1% de abatimento com 2% de declínio da atração no Índice de Leiaute e Execução de Desempenho Automotivo da J.D. Power and Associates.

Alguns podem argumentar que essa é uma boa estratégia para uma empresa que já é obrigada a pagar salários para manufaturar produtos além de sua capacidade. “Um economista diria que desde que eu possa vender o carro por mais do que seu custo variável, é melhor vendê-lo”, disse Sedatole. Mas, ela acrescenta, “essa é uma forma de pensar no muito, muito curto prazo”, pois ela negligencia os custos que acompanham ter muito excesso de estoque.

Lições Aprendidas

Usando o custeio por absorção para monitorar a eficiência pode levar as empresas a tomarem decisões pobres sobre a produção, disse Ranjani Krishnan, professor de contabilidade da universidade de Michigan e coautor do estudo (junto a Alexander Brüggen, professor associado na Maastricht University). Uma empresa que faz isso poderia parecer estar crescendo menos eficientemente quando a demanda diminuir. Se uma fábrica produz neste ano menos carros do que no ano passado, por exemplo, seu custo por carro parecerá maior e esta empresa pode, então, passar a produzir acima do necessário para apresentar-se mais favorável aos investidores, clientes e analistas.

Em vez disso, Krishnan sugere, as empresas deveriam reportar o custo da capacidade em excesso como um gasto em seu informe de rendimento interno, uma prática que pode ajudar a dar novas perspectivas a elas.

Outra maneira de evitar a produção em excesso é mudar a forma como os executivos são pagos. Como em muitas empresas, as montadoras colocam seus gerentes sob pressão para entregar o produto no curto prazo, estruturando os incentivos de compensação em torno dos indicadores, como horas de trabalho por veículo, que o relatório da Harbour Report usa para comparar a produtividade das montadoras. Com horas de trabalho fixas, a única forma de olhar mais eficientemente sob sua medida é produzir mais carros.

“Muito desse comportamento foi impulsionado pela ganância”, diz Krishnan. “Se você olhar para o tipo de incentivos gerenciais que as montadoras tinham durante o tempo de nosso estudo, as deliberações do comitê executivo, tudo tinha a ver com atingir no curto prazo números ou previsões para satisfazer analistas para que eles pudessem ganhar seus bônus”.

Em vez disso, as empresas “têm que olhar para o desempenho a partir de uma perspectiva mais holística, e não apenas olhar para os números financeiros, como a margem líquida ou o lucro ou retorno sobre investimento, mas também para as coisas como a satisfação do cliente ou a imagem da marca, coisas que podem ser um pouco mais difíceis de medir porque elas não são quantificáveis”.

Na verdade, as empresas não deveriam utilizar métodos de informes financeiros para tomar decisões internas, diz Krishnan. “O objetivo da contabilidade financeira é prover informações para os investidores que são externos à empresa”, ele diz. “Mas isso não é adequado da perspectiva das tomadas de decisões internas. A contabilidade gerencial necessita focar nas melhores formas de fornecer informações que levarão a decisões econômicas estratégicas”.

Traduzido por Tamiris Masetto Manzano.

Publicado em 27/07/2012

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