CULTURA E LIDERANÇA

Como Enfrentar a Resistência da Média Gerência?

Por que a média gerência resiste às transformações lean? Como elas podem ser engajadas?

Essa é uma ótima pergunta que estava discutindo há alguns meses com o CEO de uma empresa que está em seu quinto ano de transformação lean. Essa empresa é gemba interessante para a sua pergunta. Dois anos atrás, o mesmo CEO impressionou uma plateia de praticantes lean quando apresentou seus esforços de transformação no Lean Summit. Em uma indústria com dificuldades em sua pior crise em 20 anos, sua empresa está indo bem. Ela é rentável, tem contratado novas pessoas de forma estável e o nível de conflito interno decaiu notavelmente desde os péssimos dias com o antigo estilo de gestão.

A essência do esforço lean tem sido o comprometimento do CEO com seu gemba (ele gasta dois dias completos da semana andando por vários lugares) e um foco enorme em solução de problemas pela raiz. O CEO foca em ensinar a todos uma abordagem simples:

  1. Observe: o processo está visual o suficiente e os gerentes da linha de frente conseguem enxergar os problemas em apenas um olhar? Eles sabem como enxergar em suficiente detalhe e conseguem compartilhar esse foco específico com suas equipes?
  2. Reaja: ensine os gerentes a não deixar de lado os problemas para continuar trabalhando, mas sim que reajam apropriadamente a problemas que aparecem. O CEO trabalha com sua hierarquia para tentar e distinguir claramente as reações boas/ruins, particularmente quando lidam com fornecedores ou outras funções na empresa (por exemplo: comece olhando para si mesmo antes de culpar os outros).
  3. Reflita: desenvolva a habilidade de perguntar por que além do óbvio e procure a causa raiz do problema, a maioria das vezes examinando o que fizemos que pode ter criado a situação em primeiro lugar.

Apesar dos resultados estarem de forma bem visível, e isso ninguém discute, ainda não é fácil. O CEO aproveita as novas ideias criativas feitas por seu melhor pessoal para resolver problemas antigos de uma nova forma. Acho esses resultados impressionantes. Isso porque a maioria das visitas ao gemba está relacionada a repetir pela enésima vez as bases do 5S, ou notar que a equipe não mantém o ritmo mínimo de um problema detalhado a cada dia, ou apontar que “o fornecedor arruinou tudo” não é uma expressão satisfatória da causa.

Desafiar É um Desafio

Apesar de momentos com pensamentos verdadeiramente inovadores no gemba serem raros, essas caminhadas valem a pena. A pessoa que mais aprende no gemba é o CEO – gastando muito tempo no chão de fábrica ele tem uma boa ideia do que está acontecendo em sua empresa, o que o ajuda a delegar melhor a tomada de decisão, em particular para seus subordinados diretos. Os subordinados diretos foram desenvolvidos de forma considerável e ganharam tanto em autonomia como em envolvimento, MAS, e aqui vamos nós, apesar de copiarem o “vá ver” de seu chefe executivo, eles ainda não entenderam o desafio de perguntar por que e demonstrar respeito. Eles gastam muito tempo no gemba, mas ainda estão, na maioria das vezes, resolvendo problemas para seus subordinados diretos, em vez de fazer perguntas (apesar do CEO dizer que isso está mudando, isso ocorre lentamente).

E, sobre o ponto que você levantou, os gerentes médios ainda se ressentem a essa prática de questionar. Ressentir é uma palavra muito forte. Eles enxergam isso como uma teoria de estimação do CEO que eles colocam em prática sem muita convicção. Alguns acham isso completamente infantilizador, outros pensam que vale a pena ter discussões técnicas com seu gerente sênior, mas todos atribuem o sucesso da empresa a seu árduo trabalho (certamente) e estão convencidos de que se eles fossem deixados sozinhos para realizar seu trabalho, a empresa se sairia ainda melhor. Essa segunda opinião é considerada errada sempre que, por qualquer razão acidental, o CEO pare regularmente para visitar uma área da empresa. Em menos de três meses, os velhos demônios em apagar incêndio e culpar os outros voltam a aparecer, bem como o impacto negativo sobre os números. Nesta empresa, o valor econômico da prática lean pode ser visto muito claramente.

Para resumir, aqui está uma empresa onde o CEO vive o lean, como todos deveríamos viver também, e onde o lean traz os resultados esperados, em termos de resultados financeiros, desempenho do negócio, em termos de contratações em uma indústria enfraquecida e quanto ao envolvimento das pessoas. E ainda, como você apontou, os gerentes médios, que são a base real de todo esse progresso, ainda resistem. Isso é estranho já que essa não é uma empresa em que a gerência média é burocrática e adiciona pouco valor. De jeito nenhum. Os resultados amplos da empresa são claramente atribuídos aos esforços da gerência média.

Raízes da Resistência

Essa questão, acredito eu, alcança a parte essencial 1) do que faz do lean um método científico, 2) por que ele é tão bem sucedido, 3)e por que, apesar de seu sucesso, poucos gerentes seniores realmente adotam a prática e ela entra no sangue.

Eu poderia estar errado, mas passei a acreditar que os gerentes médios resistem às técnicas lean porque suas opiniões são geralmente desconsideradas pela hierarquia na frente de seus subordinados. As visitas ao gemba quebram as fronteiras hierárquicas, uma vez que linha toda do CEO aos operadores discutem os problemas formulados e resolvidos pelos gerentes médios. Isso desafia:

  • Sua intuição, pois a primeira resposta está geralmente errada, e perguntar por que e por que de novo é extremamente difícil. Na maioria das vezes, chega-se na conclusão de que os gerentes médios estão pensando globalmente e, na verdade, não gastaram tempo suficiente olhando para a Mão de Obra, a Máquina, os Materiais e o Método de forma específica: o que os operadores sabem fazer bem o suficiente, mas que geralmente são distribuídos para os gerentes médios, os quais acreditam que seu papel é resolver os problemas do processo.
  • Muitos gerentes médios gastam seu tempo dizendo aos outros o que fazer sem darem uma boa explicação do porquê ou como de suas ordens. Com as visitas ao gemba, eles têm que detalhar seu pensamento, e geralmente não conseguem fazê-lo (na verdade, sempre, já que a prática do desafio é pensar além).

Surpreendentemente, para qualquer executivo, é mais fácil permanecer dentro das fronteiras de estabelecer objetivos estabelecidos e deixar as pessoas continuarem a fazer o que elas querem, ou, por outro lado, dar ordens e esperar que elas sejam aceitas e seguidas sem qualquer discussão. Em uma empresa que pratique o lean, os níveis hierárquicos são muito claros, mas eles são construídos com base no respeito: cada problema é aberto para discussões baseadas em fatos a qualquer momento. Consequentemente, menos “decisões” são tomadas e as políticas evoluem a partir de explorações e experimentos repetidos – é um ambiente muito diferente (o que explica por que eles desempenham melhor). Isso é muito desafiador para a média gerênciao por causa das expectativas tanto de competência técnica como de abertura para discussões com sua equipe e colegas.

Todos a Bordo?

Pode-se fazer algo sobre isso? Duvido. Suspeito que a resistência ao pensamento profundo é simplesmente parte da natureza humana. Também acredito que o que faz das empresas lean ótimas empresas são aqueles momentos únicos de pura luz quando uma equipe vai além do padrão natural e cria novas ideias, algo que ninguém jamais havia pensado antes. Se aceitamos que a resistência da gerência é esperado, o que pode ser feito para isso ser mitigado? Não há uma forma perfeita, mas, além de dizer “muito bem” durante uma visita ao gemba, alguns eventos sociais podem ser organizados:

  1. Treinamento em solução de problemas: Em primeiro lugar, o treinamento é um instrumento falho, pois nunca temos certeza do nível de detalhe ou especificidade que isso deveria ocorrer. Conforme os gerentes seniores adquirem mais experiência com as caminhadas pelo gemba, eles também começam a enxergar algumas situações reincidirem. Os gerentes médios podem, porém, ser treinados sobre como lidar com situações específicas do trabalho, para que fiquem menos desconfortáveis ao serem desafiados e não terem feito o óbvio – isso é particularmente importante para os gerentes médios vindos de outras empresas.
  2. Reuniões: Eventos regulares e curtos (com duração inferior a meio dia) onde gerentes médios são reunidos para discutir sobre um dado tema. No caso anterior, o CEO conversará com os grupos de gerentes médios destacndo problemas específicos que ele já percebeu durante suas caminhadas (principalmente questões de segurança) e pedindo para que tudo seja particularmente cuidadoso. A ideia é fazer com que os gerentes médios entendam que eles não estão sozinhos, mas parte de uma rede de pessoas estão lutando pelos mesmos resultados.
  3. Apresentações “Mostre e Diga”: Peça para os gerentes apresentarem regularmente para seus colegas seus esforços de solução de problemas (os A3 são realmente úteis) tanto para valorizar o trabalho da pessoa como para compartilhar informações entre departamentos. Em empresas técnicas, como originados de uma universidade (uma apresentação de 20 minutos por semana ou a cada 15 dias) pode ser o único momento em que pessoas especializadas escutam com profundidade às questões técnicas encontradas em alguns outros aspectos do produto. Essa é uma base essencial para trabalho em equipe.

Tenho certeza de que há mais contramedidas, e que são apenas três que têm um investimento relativamente baixo com alto retorno. De qualquer forma, a questão permanece e, suspeito eu, sempre permanecerá. Precisamos aceitar que os gerentes médios resistirão ao serem colocados em uma situação difícil e serão engajados pessoalmente, um a um. Há alguns sinais encorajadores na empresa da qual eu falava anteriormente. Contratados mais novos que estão agora começando a chegar a níveis de gestão mais baixos são mais positivos sobre o tipo de questionamento no gemba do que os mais antigos. Aconteceu uma cena emocionante recentemente em que um “recém-gerente” disse ao CEO como seu próprio pai tinha o repreendido por não ter percebido quão sortudo ele era por trabalhar em uma empresa onde o presidente era tão envolvido com os problemas dos produtos e tão aberto a discussões. O filho apenas encolheu os ombros, mas entendeu que sua empresa era diferente de qualquer outra empresa descrita por seus amigos. Isso pareceu ser uma coisa boa.

Traduzido por Tamiris Masetto Manzano.

Publicado em 29/05/2012

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