MEIO AMBIENTE

Lean e Green - Mapeamento Ambiental dos Processos de Produção

Resumo: A partir de dois exemplos de aplicação, o artigo relata o processo de adaptação da ferramenta de Mapeamento do Fluxo de Valor para avaliação de perdas ambientais e sua utilização dentro da filosofia Lean sob uma perspectiva de sustentabilidade ambiental.  Como resultado elaborou-se o Mapa do Fluxo de Valor Ambiental, aqui denominado de EVSM (Environment Value Stream Mapping) na busca de alinhar valor social e econômico no interior das atividades produtivas de uma Usina Sucroalcooleira e de uma Indústria de Cosméticos.

1. Introdução:
Há evidências do aumento na importância estratégica de alinhar o valor social em relação ao valor econômico no capitalismo. A crise atual de cunho financeiro-econômico trouxe novas preocupações a esse debate fazendo-o mais próximo da nossa realidade. Se hoje enfrentamos as conseqüências de uma falta de sustentabilidade em créditos securitizados ao longo da cadeia econômico financeira, podemos estender nossas preocupações para uma crise ambiental com mais severas conseqüências se não cuidarmos do alinhamento entre valor econômico e valor social nas atividades produtivas.

O conceito de ecoeficiência foi um dos primeiros a combinar os aspectos de valor econômico e valor social tendo como objeto as ações corporativas. Através deste conceito e de outras idéias correlatas, iniciou-se um movimento por gestão responsável em empresas que visasse empreender ações em prol da minimização de emissões, redução no uso de materiais e energia, reutilização e reciclagem de insumos, passando a integrar programas de gestão que variavam em torno dos chamados 3Rs - reciclagem, redução e reutilização.
De fato, essa preocupação diretamente com o ambiente, que mais tarde se ampliou para o sócio-ambiental – integrando pessoas e planeta - tem levado a ações corporativas que conseguem ser atrativas aos olhos do valor econômico, melhorando o custo dos produtos vendidos, ao mesmo tempo reduzindo impactos ambientais e sociais.

Entretanto, esse comprometimento conceitual com a sustentabilidade parece ser a primeira geração no alinhamento dos valores social e econômico. O desafio de avançar no equilíbrio das decisões, tornando esse alinhamento parte integrante do dia-a-dia, deve ser o objetivo final de uma economia sustentável. Embora se tenha alcançado reduções e economias de custo, as iniciativas ainda apresentam baixa integração ao sistema de produção e operação. Elas tendem a focalizar demasiadamente oportunidades pontuais diante do desperdício histórico. Questões importantes de desperdício e impacto ambiental permanecem obscuras, sem abordagem gerencial, por não haver visibilidade na operação rotineira da área de Produção.

O campo da sustentabilidade amadureceu rumo ao alinhamento conceitual mais intricado de valores econômico e social, entretanto continuam as lacunas no que diz respeito ao alinhamento dos conceitos com as ferramentas de gestão. Como tornar o alinhamento sistêmico e amplo, sem o perigo do oportunismo? Qual ferramenta gerencial daria conta dessa tarefa com envolvimento operacional e baixo custo?

De forma geral há uma concentração de recomendações sobre princípios mais gerais que devem ser seguidos na Gestão da Sustentabilidade do que propriamente ferramentas gerenciais que tragam o fator de sustentabilidade para o interior da análise do problema, antes da tomada de decisão.

Uma via possível é a construção de mapas permitindo enxergar onde se dá a perda ambiental no processo produtivo. Mapas têm sido aplicados como uma ferramenta analítica para solução sistemática de problemas e análise de processos. Os mapas são construídos seguindo a sequência operacional passo a passo, ou o fluxo de materiais, de informação e pessoas, constituindo-se em documento para análise gerencial e tomada de decisão.

A agência norte-americana EPA (Environmental Pollution Agency) propõe a utilização adaptada da estrutura do VSM de Womack e Jones (2002) e Rother e Shook (1998), analisando o consumo de material. Originalmente, no âmbito do lean manufacturing system, essa ferramenta mapeia os fluxos de tempo e informação utilizados na produção de um produto, destacando os lead-times e estoques no decorrer da cadeia interna, nas relações com fornecedores e clientes, identificando como desperdícios os excessos e interrupções desse fluxo. A EPA propõe fazer a analogia das questões ambientais de utilização dos materiais com os desperdícios apontados pelo mapa, substituindo os desperdícios de tempo de manufatura abordados no VSM pelos desperdícios de materiais.

Embora seja um avanço no alinhamento que se busca entre valores sociais e econômicos no âmbito dos processos de produção, o fato é que ainda há uma conexão secundária do social, no caso o desperdício ambiental, ao desperdício de material, com notória preponderância da perda econômica sobre a ambiental O equilíbrio precisa ainda ser alcançado com uma visão das perdas no longo prazo, equilibrando o econômico ao sócio-ambiental. Como contribuir para esse equilíbrio do econômico e sócio-ambiental utilizando o potencial do mapeamento? Resolvemos aplicar o conceito do VSM tentando ampliar essa visão de valor agregado ao produto do cliente para valor agregado ao ambiente do cliente, o Planeta propriamente dito. Elegemos duas empresas, sucroalcooleira e  cosméticos, e escolhemos a água como recurso ambiental para ser mapeado.
 
2. Criando os conceitos e adaptando-os ao VSM no Gemba:

Em ambos os casos estudados, Usina Sucroalcooleira e Indústria de Cosméticos, após alguns mapas preliminares do fluxo total da água, em processo e como efluente, os autores buscaram alinhar as perspectivas econômica e ambiental sobre o destino da água. A primeira, vista com ênfase no processo de produção, sob uma perspectiva de valor econômico-utilitarista, que chamamos de água utilizada, e, depois, a segunda abordagem, da água vista como efluente, como um insumo ativado, porém não agregado ao produto, sendo uma perda ambiental e, portanto,  perda de um valor social. As perspectivas foram combinadas e exploradas nos mapas de fluxo da água, de forma a se constituir em uma base para análise das perdas.

- Água Ativada – Água total de entrada na operação. Inclui parcelas agregada e não agregada ao produto.
- Água Utilizada – Água que os processos necessitam para operar, direta ou indiretamente. Inclui a parcela agregada ao produto.
-  Água Agregada – Água que se constitui como parte integrante do produto final.

Essas classificações no regime de destino final das águas que adentram a operação  foram distribuídos na linha dentada (fig.01), elemento de visualização da ferramenta do VSM cuja finalidade é destacar as utilizações dadas ao insumo, em nosso caso a água, ao longo do processo produtivo, conforme pode ser observado na fig.02.

Fig.01 – Linha Dentada usada no VSM para representação dos tipos de uso das águas durante o processo.

Assim, após alguns mapas preliminares do fluxo total da água, em processo e como efluente, cujos desenhos não apresentamos aqui por falta de espaço, o grupo gerou uma classificação das perdas de água, obtidas a partir da diferença desses usos e destinos, e representadas em uma árvore de perdas:

Perda ambiental

= ativado – agregado

Perda funcional intrínseca

= ativado – utilizado

Perda funcional total

= ativado – agregado - reuso 

No topo da árvore de perdas não consideramos água agregada ao produto como perda ambiental. Evidentemente uma análise crítica do consumo poderia classificar esta parcela ou parte dela como uma perda ou desperdício, na medida em que o consumismo leva a utilizações que poderiam ser evitadas. Entretanto, no âmbito deste trabalho que se concentra no elo produtivo, consideramos apenas as perdas objetivas, aquelas que poderiam ser avaliadas objetivamente quanto à sua forma de utilização na produção do produto.

1) Perda AmbientalDiferença entre a quantidade da água ativada e a água agregada ao produto e que se constitui em um desperdício não servindo ao ciclo de Vida dos Seres Vivos e interferindo no curso natural no ciclo hidrológico do Planeta. Essa perda ambiental pode ainda ser classificada em graus de magnitude na medida em que, com ou sem tratamento, o efluente recupere ou se aproxime mais ou menos do estado original, tornando-se uma água que possa ou não servir para ser novamente captada no processo que a utilizou. Mesmo que essa possível recuperação seja plena, ela é uma perda efetiva do ponto de vista ambiental na medida em que sua utilização/recuperação ainda é uma sobrecarga sobre o ciclo hidrológico da Natureza. No decorrer da utilização do mapa e do aperfeiçoamento dos processos essa perda ambiental então poderia ser classificada segundo magnitudes de recuperação que seriam discutidas tecnicamente: alta – não recuperada, média – minimização do dano ou sustentável – plena recuperação, para ficarmos com um exemplo.

2) Perda Funcional Primária –  Parcela da água que foi ativada, porém não é utilizada pois é perdida na forma de vazamentos, evaporação, transbordo, sem uma utilização objetiva, tornando-se um desperdício de primeiro grau. É dada pela diferença entre os volumes ativados e utilizados em cada processo. Representa, portanto, a perda interna ao fluxo de produção avaliado. Normalmente acontece devido às características técnicas do processo de produção escolhido ou por insuficiência da manutenção, cujas parcelas são desperdiçadas no decorrer do processo.

3) Perda Funcional Mitigada –   Parcela da água que foi ativada descontando-se os volumes agregados ao produto e aqueles que foram destinados ao reuso em outras atividades  da empresa. Adicionalmente à perda funcional intrínseca, aqui se considera como perda funcional todo volume de água empregada em usos primários, seja em limpezas, transporte em tubulações, processos físico-químicos e tantos outros, sendo devolvido ao ambiente, com ou sem tratamento, pressionando o ciclo hidrológico, porém ao se descontar eventual parcela de reuso a perda é reduzida, com ciclo hidrológico sendo preservado por mais tempo, graças ao redirecionamento para utilizações secundárias. Da mesma forma como comentamos na perda ambiental, a perda funcional pode ser desdobrada para ser classificada em termos do grau qualitativo do efluente, na medida em que se avalie a eficácia do tratamento em termos de recondução da água em direção ao seu estado original.

3. Usina Sucroalcooleira

A Usina situada no interior de São Paulo produz açúcar e álcool. Iniciou suas atividades em 1944 e hoje ocupa uma área cultivada de 44 mil hectares de cana-de-açúcar, produzindo álcool combustível (etanol) para distribuidoras do Estado e açúcares de diversas especificações, destacando-se o açúcar cristal de alta qualidade, com participação de 4% nesse mercado da região centro-sul.

Os dados sobre utilização da água foram coletados com auxílio dos técnicos da Usina, utilizando-se os relatórios de produção, planilhas de acompanhamento do tratamento das águas e demais rotinas estabelecidas na organização. Os números apontados no Mapa e nas tabelas se referem às quantidades médias de água ativadas e utilizadas diariamente pela Usina para dar conta da produção diária de cada produto analisado. Não foi autorizado divulgar as quantidades de produtos acabados produzidos em cada processo. 

A análise utilizando o VSM ambiental se deu em três processos da usina - produção do açúcar, refinamento do açúcar e produção do álcool - acompanhados dos cálculos de perdas. Apresentamos como exemplo o mapeamento na produção do álcool.

3.1. Produção do álcool (fig.02)

Água ativada = 17980 + 18380 + 18200 + 17330 + 17198 = 88998
Água utilizada = 13138 + 4763 + 11551 + 10261 + 18862 = 53095
Água agregada ao produto = 4680

1) Perda ambiental = água ativada – agregada = 88998 – 4680  = 84318

2) Perda Funcional Primária = água ativada – utilizada = 35903. Água ativada que não exerce qualquer função nos processos. São perdas de primeiro grau, urgentes de serem minimizadas ou eliminadas nos vazamentos, cargas de tubulações, transbordos, evaporação. Permite uma avaliação do grau de desperdício dos processos.

3) Perda Funcional Mitigada = água ativada – agregada – reuso = 88998 - 4680– 63095 = 21223. Observe que a perda funcional mitigada é menor do que a perda funcional primária devido ao reuso da água em outros destinos.

Na produção do álcool (fig.02) a parcela agregada ao produto (4680 de um total de 88998 metros cúbicos) corresponde a pouco mais de 5% de toda água ativada no processo. Por outro lado, identifica-se no mapa que a Usina consegue reuso significativo da parcela não agregada, através de uma utilização em irrigação que é equivalente ao uso da água captada. Isso reduz significativamente a perda funcional mitigada com benefícios econômicos, porém não deve ser descontada da perda ambiental, pois continua tendo impacto ambiental, assim devendo ser visualizada para ser foco de redução ao mínimo possível. A irrigação na agricultura também tem exercido forte impacto ambiental e o reuso nessa atividade surge como mitigação, podendo encobrir excessos de irrigação que de outra forma poderia ser feito com menos água. É como um supermercado de peças superdimensionado que ainda encobre desperdícios. O reuso pode encobrir desperdícios na irrigação.

 

Fig. 02 - Mapa da Produção de álcool - *Água em metros cúbicos.

De forma geral o mapa ajuda a questionar a estratégia de centrar-se na captação da água e seu destino para tratamento, uma vez que a qualidade do tratamento em termos de restituir ao insumo sua qualidade de uso equivalente à água original é questionável econômica e ambientalmente. Usando-se essa estratégia operacional indefinidamente o insumo se esgotará devido sua utilização original e também não haverá água para reuso, ou, antes, ela se tornará também escassa para essa utilização. Na análise das perdas não se levou em conta a qualidade do tratamento, o que pode ser feito, porém isso não deve reduzir a quantificação da perda ambiental, apenas qualificá-la, uma vez que o objetivo lean & green não é mitigar, mas usar menos, indicando a necessidade do gestor privilegiar a redução do consumo no lugar da minimização dos impactos. Esse é o diferencial na abordagen Lean & Green. Se esta estratégia for privilegiada a pressão sobre o ambiente será menor, dando-lhe condições de restituir ou regenerar as fontes. Há um potencial de racionalização no combate aos desperdícios em vazamentos, usar menos volume para limpeza e redução na utilização de água nas transformações operacionais, buscando processos mais eficientes.

Tal abordagem mais radical do ponto de vista de perda ambiental não desestimula políticas de reuso, uma vez que isso reduz a perda funcional mitigada, como verificado na produção do álcool em que a mistura do vinhoto e água tratada produzem o efeito de fertilização e irrigação. Neste aspecto a perda econômica é reduzida, porém a perda ambiental é tão somente mitigada. Reconhece-se que a ferti-irrigação com Vinhoto também pode trazer danos com a salinização do solo. Portanto, melhor que mitigar é eliminar.

Com relação à estratégia de reduzir a utilização o mapa se mostra útil também para detectar processos críticos. É o caso daqueles processos identificados em que a temperatura mais elevada provoca um grande desperdício na evaporação do processo. Na produção do açúcar (cujo mapa não incluímos aqui) o maior desperdício está na evaporação a vácuo e no spray de secagem, onde para cada quantidade utilizada de 7.610 metros cúbicos de água, ativa-se 10.022 metros cúbicos, uma taxa de desperdício de quase 24%, configurando uma perda funcional primária  devido a alta evaporação em função da temperatura do processo.

Na produção do álcool (caldeira, fermentação e destilação – fig.02) também encontramos o mesmo tipo de problema. Esses processos de alta temperatura geram perdas primárias da ordem de 30 a 45%.

Outra informação propiciada pelo mapa é a indicação dos tempos de set-up (preparação das operações) cujos processos envolvem a utilização de água durante limpezas de vasos e tubulações, bem como perdas por evaporação em ciclos de resfriamento e reaquecimento. A busca de menor tempo de preparação representaria maiores cuidados na utilização de água nesses ciclos, com mais eficiência em limpezas e rampas de temperatura mais baixas, com estabilização mais rápida nas temperaturas de operação e respectiva redução das perdas por evaporação nos ajustes mais demorados.

Caminhar no Gemba também é essencial para entender  e complementar as informações do mapa. Observando o caminho da água desperdiçada na forma de efluentes notou-se que boa parte dela se origina na mistura da água com efluentes sólidos provenientes do processamento da cana. A ausência de filtragens mais eficazes impede seu aproveitamento no momento da operação e a direciona para um longo percurso até as instalações de Tratamento nas quais novamente se misturam com outras águas e são tratadas antes do descarte. Considerou-se a melhoria dos processos de filtração com vistas a separar os dejetos da cana e aproveitar a água em outros pontos de uso com bifurcações na tubulação e uso de válvulas. Segundo o pessoal técnico da Usina tal procedimento já tinha sido considerado em projetos internos de melhoria contínua, porém, a exemplo do que acontece na manufatura, foi justificado suspender por falta de destinação de verba.  Aqui um Kaizen é recomendado para se fazer o que é necessário sem gastar muito.

Embora tais considerações surgissem a partir da análise do Mapa Atual com vistas a construir um Mapa Futuro, essa primeira experiência demandou todo esforço na adaptação do VSM, não tendo havido tempo suficiente para se discutir a etapa de mudanças para o desenho de um Mapa Futuro. Uma segunda oportunidade era planejada para aplicar-se um segundo teste dos conceitos e construção do Mapa Futuro. Realizamos isso numa planta de cosméticos.

4. Indústria de Cosméticos.

A empresa de cosméticos possui um negócio de grande porte, cuja unidade fabril está situada no estado de São Paulo. A empresa opera com uma alta taxa de inovação e conseqüente elevado número de lançamentos de produtos, a mesma desenvolve e produz produtos de higiene pessoal e beleza nas diferentes categorias: fragrâncias, maquiagem, cuidados para pele (cremes, loções, tratamentos), cuidados para o cabelo (xampu, condicionador, tratamentos), produtos de uso diário (desodorantes, sabonetes, e outros).Produz uma gama variada de produtos de higiene pessoal e cosmético e atende o mercado brasileiro em sua maioria, entretanto também produz para exportação.

As matérias primas principais para produção de fragrância, desodorante e cremes são: água, álcool, glicerina, óleos especiais, além uma grande gama de produtos químicos. No caso de maquiagem, a produção quase não utiliza água, somente para lavagem, em baixa quantidade.

Diferentemente da USINA a Fábrica de Cosméticos apresenta uma maior variedade de produtos distribuídos em linhas de produção de bens de consumo em massa. Dessa forma há uma característica mais próxima de uma indústria de manufatura embora conserve também proximidade com a indústria de processos devido à produção contínua de cremes e líquidos. Devido à complexidade o grupo resolveu mapear um produto específico representativo da produção manufatureira. Foi eleito o creme cosmético cujo volume de produção era mais representativo. Produzido em potes de 50 g apresenta um volume da ordem de 200 milhões de unidades por ano.

4.1) Produção de creme  cosmético (Fig 03)

Com o aprendizado da USINA os autores já buscaram o mapeamento direto da água ativada e utilizada no Gemba, como mostrado na Fig 03.

Água Ativada = somatória das quantidades de água que adentram em cada etapa do processo e consumo humano = 11 + 55 + 19 +14  = 99

Água Utilizada = 11 + 55 + 19 + 14 = 99 (observe que a água ativada utilizada é praticamente igual à água ativada servindo como sinal de que não há perdas por vazamento ou transbordo)

Água agregada ao produto = 30 l de água

asdf

Fig 03: Mapa Atual da produção de creme - 50kg de creme com 30kg é água

1)  Perda Ambiental  = ativada – agregada = 99 – 30 = 69 l 

2) Perda Funcional Primária = ativada - utilizada = 99 – 99 = 0. Observe que toda a água ativada é utilizada nos diversos processos. Portanto há eficiência no transporte da água e na sua destinação às atividades da fábrica. Praticamente os vazamentos, evaporações, transbordos etc, estão controlados.

3) Perda Funcional Mitigada = ativada – agregada – reuso = 69 l. Número exatamente igual ao da Perda Ambiental. Não há mitigação. Observe que toda perda ambiental se concentra na forma de utilização da água pelos diversos processos e não há nenhuma mitigação dessa perda através de reuso.

 

Analisando o quadro acima podemos notar que a taxa de desperdício da água sob um ponto de vista estritamente econômico se resume à utilização funcional, entretanto a introdução do que chamamos de valor social permite-nos ir mais além e observar que a enorme quantidade de água utilizada funcionalmente, além da parcela agregada ao produto, transforma-se em perda ambiental de 70%. Uma visita ao Gemba também permitiu constatar que essa perda ambiental é mais grave socialmente na medida em que a água não é reutilizada e torna-se um efluente de qualidade inferior ao estado original em que foi captada. No Go See (vá e veja com seus próprios olhos) vimos que grande parte da água utilizada se destina à lavagens de equipamentos e instalações ao longo do processo sendo coletada para tratamento cujo processo de mitigação não é adequado e despeja a água no  rio, uma vez que a coleta de esgoto municipal não existe na região.

A revisão dos processos de lavagem, que totalizam uma perda de água de 69 l em 50kg de produção de creme, permitiu repensar a utilização de mangueiras sem padrão de trabalho e sua substituição por equipamentos pressurizados mais eficientes, o que levou à redução de 40 % no consumo. A maior parte desses processos revisados estão previstos para conclusão em 2010 e suas metas podem ser vistas no Mapa Futuro (fig.04).

Na parte superior do mapa pode-se visualizar a melhoria na qualidade do tratamento da água e seus benefícios ambientais. Um novo projeto em elaboração deverá ampliar a ETA e adicionar o tratamento biológico com adição do efluente de consumo humano. A água final gerada, ainda não retornará ao estado original, portando não poderá ser reutilizada nos processos produtivos ou na formulação do produto. Entretanto, poderá ser consumida na sua totalidade em sanitários e jardinagem com a implantação de reuso.

 

Fig 04: Mapa Futuro da produção de creme.

Observa-se o ganho econômico e social com a redução da Perda Ambiental de 69 para 29 litros através de reduções das águas utilizadas nos processos, além do benefício do reuso de toda água, representado no indicador de perda funcional mitigada que atingiu o valor de zero.

6. Conclusão

O diagnóstico propiciado pelo VSM ambiental em ambas plantas constatou que os processos de produção têm um largo campo de redução da água ativada e utilizada. O mapa privilegia a forma como a água é empregada em cada etapa do processo, levantando seus pontos críticos. A partir daí pode-se visualizar e questionar o dispêndio do insumo em cada forma de utilização durante o fluxo. Exemplificado nesses casos para a água o mesmo pode ser feito para outros tipos de insumos: energia elétrica, ar comprimido, vapor, materiais diversos, de acordo com sua importância na matriz de produção e do respectivo impacto ambiental, na medida em que são descartados no ambiente ou são equivalentes à volumes de água impactados ou de carbono liberados na atmosfera.

Os desenhos do mapa atual permitem visualizar no dia-a-dia o grau de desperdício que ocorre em cada etapa do fluxo produtivo e estabelecer metas por processo, através da visão de como o insumo poderia ser utilizado de forma diferente, estabelecendo uma referência para a melhoria contínua no sentido de apontar o que reduzir, quem deve reduzir e como reduzir. No caso da água foram estabelecidas metas tanto econômicas  na redução funcional da água, quanto sociais, no que diz respeito ao reuso e à melhoria na qualidade do tratamento realizado no efluente. Essa visão com as melhorias projetadas devem ser expressas no Mapa Futuro (fig.04).

As experiências aqui descritas permitiram comprovar o benefício da utilização do conjunto dos mapas para visualizar medidas mais concretas e sistêmicas de uso mais eficiente dos recursos, e criação de mais valor para toda a cadeia e a sociedade. O mapeamento do fluxo de valor ambiental, diferentemente de outras ferramentas de Gestão Ambiental, permite enxergar as perdas econômicas e sociais associadas ao processo de produção de um ponto de vista do seu fluxo e do Planeta como cliente desse fluxo. Essa perspectiva radicalmente Lean, de criar valor para o Cliente e o Planeta sendo considerado Cliente, leva à busca de eliminar o uso da água e não de apenas construir mais uma estação de tratamento. Quando os custos da água de fato forem proibitivos, com a mão invisível do mercado exigindo medidas mais eficientes na redução da ativação e uso, talvez já seja tarde para o ambiente e a sociedade. Os mapas e sua visualização nessa perspectiva Lean são uma contribuição para essa discussão.

Publicado em 27/08/2009

Planet Lean - The Lean Global Networdk Journal