DESENVOLVIMENTO DE PRODUTOS E PROCESSOS

Gerenciando por indicadores: medir o desempenho com os indicadores errados levará os gerentes a manipularem os números

YOKOTEN DE JIM WOMACK. A liderança sênior deve aprender como entender o trabalho se quiserem se livrar dos indicadores sem sentido que levam os gerentes a “manipularem” os números ou jogarem a responsabilidade para outro departamento.

Estamos chegando ao final do segundo turno, e o gerente de uma grande fábrica está em pé na área de expedição. Ele está garantindo que os caminhões estejam no lugar certo para que toda a carga que precisa sair hoje à noite seja carregada. Esse é um bom exemplo de um líder prudente que não só fala, mas age para atender a demanda do cliente sem falhas? Bem, não exatamente.

Para entender a situação, você precisa de mais um fato: é o último dia do trimestre. A carga precisa sair antes da meia-noite para alcançar a meta de vendas da fábrica (o principal indicador do gerente), não importando a condição ou o destino dos bens. Se isso não acontecer, o gerente recebe uma advertência da matriz, perde seu bônus ou algo pior. Entretanto o processo de produção teve problemas e não conseguiu produzir a quantidade necessária para atingir a meta. Então o gerente vasculha o lote para encontrar itens que foram previamente produzidos, mas não pedidos por clientes, porque a fábrica tinha as peças para produzi-los, mas não aquelas necessárias para produzir os itens encomendados. Ele enviará esses itens para o departamento de vendas alcançar sua meta.

Isso não é um problema para a divisão de vendas, porque eles têm espaço disponível no almoxarifado, e não é penalizada por aumentar seus estoques. O indicador mais importante para ela é o volume de vendas para os clientes. Então todos atingirão suas metas e ganharão seus bônus mesmo que o custo total da empresa tenha aumentado.

Seja bem-vindo ao mundo da gestão por indicadores, o que eu chamo de indicadores sem sentido.

Há vinte e cinco anos, quando comecei a ver cenas assim, pensei que os gerentes seniores cairiam em si e parariam de julgar os gerentes de menor escalão por apenas uma dimensão, por indicadores pontuais. Mesmo assim, a cena que descrevi acima ocorreu no começo de 2015 em uma grande e progressista multinacional. Como pode ser?

Não acho que a causa raiz seja gerentes “ruins” na linha de frente (por favor, veja minha coluna de 30 de abril). Vi muitos gerentes “manipulando” indicadores em tantas empresas de tantos países que acho que o problema é a situação, e não o personagem. Caso contrário, as boas pessoas (que eu sei, por experiência pessoal, que muitos desses gerentes são) estão sendo colocadas em situações impossíveis onde seu progresso, bônus e até seu emprego dependem da manipulação desses números, porque está acima de seu conhecimento ou capacidade de melhorar o processo de criação de valor. Então entendo por que eles fazem o que fazem. Eu provavelmente manipularia os números também.

Entretanto não acho que os gerentes dos altos escalões que elaboram os indicadores para julgar os gerentes de níveis mais baixos sejam pessoas ruins também. Todas as organizações têm uma necessidade de avaliar seu desempenho, e parece natural escolher algumas medidas simples – aparentemente coisas boas, como desempenho e vendas pontuais – para julgar como cada gerente de níveis mais baixos está se saindo. Mas quando os gerentes de níveis mais altos não entendem de verdade como o trabalho pode ser melhorado a fim de criar mais valor, não entendem como os fluxos de valor interagem uns com os outros e não sabem como dar as ferramentas para que os gerentes de níveis mais baixos melhorem-no, eles caem na crença simples de que fazer seus gerentes alcançarem metas simples beneficiará a empresa. Um ótimo exemplo recente é a determinação da CEO da General Motors Mary Barra para que os gerentes da GM pós-falência atinjam seus números: “você fez seu plano; agora alcance-o”. Note que não há menção de como fazer o plano, quais são as consequências para as outras partes da organização ou para os clientes desse plano, ou quais são as possíveis barreiras [Laura Colby, The Road to Power, Wiley, 2015, pág. 122].

Como podemos fazer melhor? Como podemos criar o que chamarei de indicadores conscientes para produzir bons gerentes e empresas melhores?

Podemos começar entendendo um fato simples: exceto por causa de sorte (por exemplo, uma mudança nas taxas de câmbio, um aumento repentino nas vendas quando um competidor não consegue atender a demanda), é impossível melhorar o desempenho de uma atividade que é julgada por um indicador sem melhorar o trabalho de criação de valor e remover o desperdício. Então como um gerente de baixo nível melhorará o trabalho e removerá o desperdício e o que isso significará para o resto da organização são perguntas-chave para o gerente de níveis mais altos quando estiverem elaborando um indicador e avaliando o desempenho.

Se acreditamos que o bom desempenho em um indicador deve ser baseado em um processo de criação de valor melhorado, então um indicador consciente deve considerar o desempenho atual do processo (fluxo de valor), a lacuna entre o desempenho atual e o necessário (a melhoria necessária para satisfazer o cliente e sustentar a empresa), as causas raízes da lacuna (que estão na organização do trabalho) e os passos que precisam ser dados (os experimentos que precisam ser tentados) para preencher a lacuna no futuro, normalmente no final de um trimestre ou do ano. Isso, claro, parece uma boa oportunidade para usar um A3, e realmente é. De fato, sempre que ouço uma comemoração por alcançar uma meta – como as vendas reportadas pelo gerente na expedição – sem o apoio de um A3 que mostre o processo de criação de valor, a causa da lacuna anterior e os experimentos feitos para preenchê-la, fico desconfiado.

Com indicadores conscientes, cada gerente de alto nível julga cada gerente de baixo nível sobre o que ele ou ela fez para melhorar e sustentar o desempenho de seus fluxos de valor ao repensar o trabalho e remover o desperdício. Sobrecarregar a expedição para impor custos no resto da organização não conta! Mais que isso, para o gerente lean de alto nível e experiente, atingir as metas não é o objetivo. As metas se baseiam em uma previsão que dificilmente estará “certa” no final do período de relatos. O que é criticamente importante (e isso não pode ser medido por qualquer indicador trimestral), com dividendos pagos no futuro distante, é melhorar constantemente e sustentar todo processo de criação de valor que é gerenciado.

As organizações que fizerem isso ainda terão indicadores. Todos precisam conhecer suas lacunas na criação de valor para os clientes, e os indicadores podem encontrar essas lacunas. Mas o foco dos gerentes estará nos passos tomados para melhorar os fluxos de valor em vez de alcançar as metas. O desafio para nós da Comunidade Lean é mentorar os gerentes de alto nível de todas as organizações para que eles possam aprender a enxergar o trabalho e o desperdício e que possam mentorar seus gerentes de níveis mais baixos na melhoria de seu trabalho e na remoção de desperdício, que serão medidas por indicadores conscientes apoiados por A3.

Fonte: Planet Lean.

Publicado em 20/07/2015

Planet Lean - The Lean Global Networdk Journal